23 dezembro 2013




O sentimento de pesar pela morte de Nelson Mandela ainda está latente em todo o mundo.  Ele que indiscutivelmente foi, e será, uma das maiores personalidades da nossa história. Com uma trajetória sofrida e cheia de conquistas, Mandela nos deixa na matéria, mas o seu legado viverá entre nós durante muito tempo. Quando falo de legado não me refiro apenas da inquestionável luta dele contra o racismo. Se pararmos para pensar um pouquinho, ele nos lega algo maior do que isso: a necessidade de se lutar por alguma causa. Num mundo onde o umbiguismo reina soberano, é difícil ceder um pouco do nosso tempo para reivindicar algo nobre. Acostumados a ficar refugiados na zona de conforto, não lutamos mais por um mundo melhor, onde discriminações e preconceitos possam ser significativamente diminuídos. Ao contrário disso, continuamos a semear tudo aquilo que Mandela durante toda a sua vida guerreou: o desrespeito ao ser humano.

Na carona do líder africano, dentre as inúmeras lutas que necessitam de fortes soldados está a que se refere ao preconceito racial. Mesmo sabendo que o Brasil é formado por um caldeirão de etnias, muitos ainda nutrem aversão aos negros, apesar da escravidão ter sido extinta há tantos anos. As razões para esse tipo de pensamento são muitas, porém incoerentes, visto que não há nada que nos diferencie enquanto seres humanos, muitos menos a cor de nossa pele. A herança de uma era de escravidão, a qual reinava o discurso do que os negros não possuíam almas, fez com que perpetuássemos a ideia de que esse grupo fosse inferior aos outros. Sem contar que além desse estereótipo errôneo, outros ligados a marginalidade e subserviência sobreviveram todos esses anos. Por isso que é comum presenciar situações das quais os afrodecentendes são agrupados entre aqueles que devem apenas servir, ou ser alvo da criminalidade crescente do país. Com isso, cotas são repudiadas, pois não fomos educados a dar direitos e quem infelizmente nunca os teve. Nesse momento, cabe seguir o exemplo de Mandela e lutar por um mundo multicolorido, onde não há soberania entre os humanos, mas sim igualdade, ou no mínimo tolerância.

Outra luta importante é a que se refere à discriminação de gênero. Historicamente, o machismo travestido de patriarcalismo fez com que a mulher demorasse a conquistar seu devido lugar na sociedade. Hoje, temos uma presidente no poder, mas nada disso parece ter sido suficiente para diminuir a violência contra essas que ainda trazem cravadas na pele a indelével marca do “sexo frágil”. Isso porque se aprende desde cedo que o sexo masculino é dominante, ao contrário do feminino, o qual ainda é educado com limitação e recato. Essa descabida diferenciação educacional acaba resvalando numa sociedade onde perdura o machismo, tanto entre os homens quanto entre muitas mulheres, as quais se “acomodaram” com o segundo plano do qual foram sentenciadas. Por essa razão, os índices de violência contra elas não diminuiu. Pelo contrário, recentemente foi divulgado que a Lei Maria da Penha não está contendo o número de casos de agressões e mortes contra as mulheres. Os motivos são muitos, desde falta de pessoal capacitado para atendê-las, até a falta de denúncia das vítimas. Porém, penso que o principal vilão ainda é a nossa falta de vontade, e de coragem, de lutar contra isso também.

A educação é a arma mais poderosa que você pode usar para mudar o mundo”. Foram essas as sábias palavras ditas por Mandela e que me comoveram bastante. Como alguém que nasceu, cresceu e morreu num dos continentes mais degradados do planeta em vários sentidos, consegue perceber algo que o nosso país insiste em não enxergar? Educação, essa sim é uma grande causa para se lutar. Numa sociedade onde ser ignorante é natural. Ou pior, onde não ter conhecimento é o mesmo que servir de curral em período de eleição. Esse desrespeito com o saber é ignorado ano após ano e nada fazemos para mudar essa realidade. Esse descompromisso com o educar já é antigo e sabido por todos, porém poucas são as atitudes para revertê-lo. Cobram-se mais políticas públicas. Maior investimento governamental. Exige-se que uma maior parte do PIB seja direcionada para tal setor. São tantas as cobranças e metas e tão poucas as realizações que nos esquecemos de que a educação é um compromisso de todos. Do lar até a urna, da alfabetização à faculdade, somos responsáveis pela formação dos indivíduos que nos cercam. Por isso, cabe primeiro a nós nos transformarmos e, se possível, nos organizarmos para reivindicar melhorias nesse setor também. Quem sabe assim a arma que Mandela citou há pouco possa de fato modificar a triste realidade educacional e, portanto, social do país.

Nessa constante busca por um mundo melhor, é importante tocar numa outra questão bem conhecida, desde a África até o Brasil, a fome. Lamentavelmente, muitos são aqueles que nesse momento não possuem nada para servir aos seus filhos e parentes. Pessoas que por diversas razões foram esquecidas e que sobrevivem à míngua, geralmente em condições desumanas, onde a falta de comida é um desafio diário. Por aqui, mesmo com programas que visam minimizar essa inaceitável realidade, muitas pessoas ainda morrem de desnutrição, ou sofrem de doenças correlatas à falta de alimento. É contraditório saber disso num país rico em terras plantáveis, onde se cultiva tanta variedade alimentícia. Também é paradoxal saber que exista fome, numa sociedade que desperdiça toneladas de alimentos diariamente ao invés de direcioná-los a quem tanto necessita. E, por fim, é imoral saber que existam pessoas capazes de diminuir essa realidade com significativas doações, mas preferem deixar a cargo do governo essa responsabilidade. Nessa luta pela sobrevivência, o maior inimigo é, portanto, a disparidade social. Muitos com pouco e poucos com muito. Muitos discursos bonitos, mas poucas ações. Muitos desperdícios e muitos desnutridos. Muitos sacrificados, mas poucos sacrifícios. Muitos de boca cheia e outros muitos de barriga e futuro vazios.

Nesse mar de incertezas e violências cotidianas, eu não poderia deixar de mencionar uma das causas que mais tem ganhado à mídia e a sociedade como o todo: a criminalização da homofobia. Por mais que alguns considerem desnecessário criar leis específicas para assegurar a proteção dos homossexuais, destaco que no Brasil infelizmente as leis que prometem proteger toda a população infelizmente não são cumpridas. A prova está na Lei Maria da Penha, direcionada predominantemente para violência contra a mulher. A do racismo, contra a discriminação racial. Entre outras especificidades legais que são criadas para suprir a deficiência legal da nação no tocante às minorias. Então, porque não criminalizar a homofobia? Recentemente o projeto que tentava fazer isso foi arquivado. Líderes, de ideologia duvidosa, garantiram que direitos a favor da comunidade gay fossem indecorosamente arquivados e esquecidos.  E isso acontece porque o desconhecimento da sexualidade humana agrupa os homossexuais no gueto das anomalias, dos mutantes. Estes, portanto, não merecem ser vistos como cidadãos, mas como a escória de uma sociedade machista, fundamentalista e indiscutivelmente ignorante. Enquanto isso, nossos iguais são excluídos, feridos e mortos, contudo não nos importamos com a causa deles, pois fomos educados a ignorar isso também.

Seguindo a trilha do desrespeito, nossa saúde pública agoniza em filas de hospitais lotados ou nos seus insalubres corredores.  Faltam médicos e aparelhagem de qualidade. Faltam medicamentos e leitos adequados para os pacientes. Faltam investimentos e, sobretudo compromisso com esse setor. Com a segurança pública acontece algo semelhante. Ela que carece de pessoal qualificado e preparado para lidar com os diversos tipos de criminosos que insistem em exibir a real face da pobreza do país. Essas também são boas razões para se lutar. Nesse campo, nunca é demais reivindicar melhores instalações para os presidiários, para que eles possam ser ressocializados e não ensinados a serem piores do que já eram. Outras lutas são aquelas que se referem à corrupção, que insiste em macular a imagem já manchada do país. Sem se esquecer de lutar pela proteção e preservação do meio ambiente. Pela garantia dos direitos da criança e do adolescente. Pelo respeito ao idoso na rua, nos coletivos, nos hospitais, dando-os a preferência merecida. Por um transporte público decente. E pela assegurada regulamentação dos nossos direitos e deveres.

Lutar contra o trabalho escravo, seja ele infanto-juvenil ou sexual. Lutar pela melhoria das condições salariais do trabalhador brasileiro. Lutar para que o professor, espinha dorsal da metamorfose social, seja bem gratificado pelos seus feitos. Lutar para que o voto valha a pena. Lutar para que as religiões aqui existentes sejam respeitadas. Lutar pelo respeito aqueles que não possuem religião. Lutar por um Estado de fato laico. Lutar pelos índios e sua perpetuação. Lutar contra a violência em todas as suas instâncias. Lutar contra o consumismo. Lutar contra o consumo excessivo de drogas, seja lícita ou não. Lutar contra esse sistema engessado que não apresenta melhoras. Lutar por uma vida mais digna. Lutar pela felicidade, pela liberdade, pelo amor e pela justiça. Lutar pela utópica paz. Lutar contra qualquer tipo de intolerância, discriminação ou preconceito. Lutar contra essa falta de coragem de lutar e, enfim, ir à luta contra toda a ausência de direito que nos acomete ou aos nossos semelhantes. São tantas causas a serem seguidas. Tantas reivindicações necessitando de vozes para serem ecoadas. Tantos caminhos para transformar nossa existência, que eu poderia fazer um livro só sobre isso. Mas, prefiro encerrar esse texto com uma magnífica mensagem de Mandela: “A luta é a minha vida. Continuarei a lutar até o fim dos meus dias”. Ele cumpriu a parte dele. Falta a sua, a minha e a nossa parte. Então, vamos à luta, povo, pois ser feliz é ser livre!

        Marcas que perpetuam em pessoas de cabelo crespo, lábios grossos e pele escura. Um histórico formado por feridas vulcânicas que perpassam a carne e penetram na alma, criando uma chaga de racismo branco que encontrou, e ainda encontra, refúgio nos rostos de racistas do séc. XXI. Afinal, a corrente que prendia os mulatos na senzala foi quebrada em 1888, mas, a ferrugem impregnada de racismo europeu ainda é o legado europeu.

            Com a chegada de Bantos e Sudaneses para o Brasil, como mão de obra escrava, os colonos aqui residentes detinham o poder sobre a vida no negro, rejeitando suas culturas, crenças, costumes e os tornando objetos. Entretanto, o país, em 1850-1888, criou leis abolicionistas para que o direito dos negros pudesse ser legitimado. Mas isso não aconteceu por excelência. Afrodescendentes que não tinham onde morar ocupavam quilombos e morros, começando, assim, a marginalização.

            No nosso meio social, os estereótipos criados para pessoas cafuzas são de ladrões, traficantes e vagabundos. Quanto às suas culturas, são tidas como primitivas. Suas crenças, são demonizadas. E seus costumes, embora aderidos indiretamente na sociedade, estão relacionados a algo arcaico e rupestre. Vale pontuar que algumas expressões verbais carregam discriminações, tais como: mulato, que deriva de mula, por exemplo e que ainda está inserido em nosso dialeto.

            Salientando, ainda, o “apartheid” entre negros e brancos, hoje se faz presente em nosso cotidiano televisivo programas em que a maioria dos atores e apresentadores seguem o modelo europeu. Todavia, afrodescendentes ocupam destaque na mídia: se protagonistas, o enredo normalmente é escravista; se coadjuvantes, são empregados domésticos e/ou ocupam cargos menores.

            O nosso país foi, e ainda é, marcado por “guerras” para com pessoas de pele escura. O ideal a se fazer é legitimar a igualdade em direito de todas as cores e raças, como está escrito em nossa constituição, no artigo 5º. Deve-se haver, também, uma maior participação das manifestações de origem africana. Afinal, como bem afirma Bob Marley: “enquanto a cor dos olhos for mais importante que o brilho dos olhos, haverá guerra”, ou seja, a melanina que pigmenta o nosso corpo não precisa ser motivo para segregação.

Aluno: Cleston francisco
Professor: Diogo Didier


Perguntar não ofende, deputado. Ou ofende? Seu ódio aos gays é suspeito. 

Todo homofóbico, a meu ver, tem algum problema de sexualidade. Porque uma coisa é um homem só gostar de mulher. Bravo, está no seu direito. O homem hetero também pode não se sensibilizar com a causa gay, não ser militante por direitos iguais, ter uma ideia conservadora de família e ser até contra o divórcio. Bravo, há espaço para todos. Outra coisa, bem diferente, é um homem odiar homem que goste de homem. Achar que homossexualidade é doença. Querer varrer homossexuais para dentro do armário. Ou coagi-los, transformando os gays em cidadãos de segunda categoria.
Desses, eu desconfio. Caramba, esse pastor evangélico catapultado a presidente de Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara, à revelia da sociedade civil, só pensa naquilo. O deputado do PSC de São Paulo – e PSC, minha gente, quer dizer Partido Social Cristão – a todo momento, semana sim, semana não, dá um jeito de colocar na pauta mais um projeto que retira direitos já conquistados por homossexuais. Num retrocesso inadmissível. O mundo atual é outro, muito mais tolerante com a diversidade sexual. E muito mais avesso ao preconceito.
Em São Paulo, um debate público que começou ontem e termina amanhã, promovido pela Escola Paulista de Medicina da Unifesp, junto com a Organização Mundial da Saúde (OMS), revê a Classificação Internacional de Doenças (CID), no que se refere à sexualidade. A nova edição da CID formaliza enfim a igualdade entre orientações sexuais no mundo todo. É condenável, portanto, segundo a OMS, a visão distorcida e discriminatória da homossexualidade como uma “doença” que pode ser “curada”. Está explicado (precisa desenhar, sr Feliciano?) que qualquer orientação sexual deve ser considerada uma parte intrínseca e natural do desenvolvimento do ser humano.
Por que o deputado insiste em espernear? Quem é, na vida pregressa, o pastor de ovelhinhas brancas e heterossexuais, que deu tantas declarações racistas e homofóbicas e que, por causa de nossa política do toma-lá-dá-cá, passou a cuidar dos Direitos Humanos, um escárnio para todos que participaram do abaixo-assinado de 450 mil contra sua nomeação?
Marco Feliciano tem origem pobre. Diz que trabalhou como vendedor de picolé. Começou a pregar aos 19 anos e tentou ser pastor em Belém. Em sua biografia, diz-se que foi rejeitado por líderes religiosos da própria Assembléia de Deus e de igrejas pentecostais. Só aos 26 anos, ainda sem a consagração de pastor, foi reconhecido pela Assembléia de Deus. Aos 27 anos, viajou para os Estados Unidos e foi consagrado pastor. Fez curso de contabilidade, faculdade de teologia e é doutor em Divindade e Artes da Teologia por uma instituição americana.
Ainda responde a uma ação por estelionato aberta pelo Ministério Público gaúcho no STF. É acusado de ter recebido R$ 13 mil para realizar um culto ao qual não compareceu. Seu advogado diz que ele devolveu o dinheiro.
Os vídeos em que aparece são mais contundentes do que qualquer ação ou acusação não comprovada.
Vídeo 1: Feliciano pede a senha do cartão de crédito a um fiel de sua igreja.
“É a última vez que eu falo. Samuel de Souza doou o cartão, mas não doou a senha. Aí não vale. Depois vai pedir o milagre pra Deus, Deus não vai dar, e aí vai falar que Deus é ruim”.

Vídeo 2: Feliciano diz em culto que John Lennon foi morto por “vingança divina” por ter dito que os Beatles eram mais populares do que Jesus Cristo.
“Ninguém afronta Deus e sobrevive para debochar”. “Eu queria estar lá no dia em que descobriram o corpo dele (Lennon). Ia tirar o pano de cima e dizer: me perdoe John, mas esse primeiro tiro é em nome do Pai, esse é em nome do Filho e esse é em nome do Espírito Santo”.

Vídeo 3: Feliciano diz que Dinho, vocalista do Mamonas Assassinas, “se vendeu ao diabo” por dinheiro e por isso morreu em acidente aéreo.
“O avião estava no céu (...) Ao invés de virar para um lado, o manche tocou para o outro. O anjo pós o dedo no manche, e Deus fulminou aqueles que tentaram colocar palavras torpes na boca das nossas crianças”.

Vídeo 4: Feliciano fala de Caetano Veloso e Lady Gaga.
Caetano conseguiu sucesso com ajuda de “forças malignas” após encontro com Mãe Menininha do Gantois.
“O diabo tem uma Lady Gaga que canta e encanta”.

Vídeo 5: Feliciano contra a Igreja Católica.
Católicos “adoram Satanás” e têm o corpo “entregue à prostituição”. Classifica a religião católica de “morta e fajuta”.

Vídeo 6: Feliciano contra gays.
“O meu Jesus não foi feito para ser enfeite de pescoço de homossexual, nem de pederasta. Nem de lésbica”.

Ok, Marco Feliciano pode ser um doente que resistiria a qualquer tentativa de cura psiquiátrica. Sem problema. Bem-aventurados sejam os pobres de espírito.
Mas, colocar na presidência da Comissão de Direitos Humanos da Câmara um deputado desses?
Vejamos suas últimas tentativas de legislar sobre a sexualidade.
No mês passado, outubro de 2013, a Comissão aprovou projeto de Marco Feliciano. Ele ressuscitou um texto que estava parado havia dois anos na Câmara. Objetivo? Dar direito a expulsar gays de cultos religiosos. Em setembro, Feliciano mandou prender duas jovens que se beijaram num culto ao qual ele estava presente, em São Sebastião (SP). Pediu que os policiais dessem “um jeito nas meninas”. Elas saíram do local algemadas e num camburão. O deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) protestou contra o projeto aprovado: “É a descriminalização da homofobia nos templos”.
O pastor deixou passar um tempinho e voltou à carga agora: a Comissão presidida por ele aprovou dois projetos que, se levados adiante, farão o Brasil voltar atrás e desgarrar da tendência mundial. Um dos projetos suspende resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de maio de 2013, que autoriza cartórios a realizar casamentos entre pessoas do mesmo sexo. A Comissão presidida por Feliciano também rejeitou, na mesma reunião, proposta que daria a companheiros de gays direito de receber pensão pelo INSS. Homossexuais, segundo Feliciano, não podem ter direitos previdenciários garantidos a outros cidadãos. Por várias vezes Feliciano tentou colocar na pauta da Comissão o projeto que permite a psicólogos a “cura gay”.
Sério. O que pensa de tudo isso a ministra da Secretaria de Direitos Humanos de Dilma, Maria do Rosário? O que pensa a presidente Dilma Rousseff, que ontem chamou a sociedade brasileira de ainda "sexista e preconceituosa" contra as mulheres? O que dizem os cidadãos deste país, que tem outras prioridades, como a não violação de direitos humanos de todos, qualquer que seja a cor, a classe social, o gênero e a orientação sexual?O que quer dizer a obsessão sexual de Marco Feliciano? Nessas horas, eu me lembro do magnífico filme Beleza Americana, de Sam Mendes, em que um coronel (Chris Cooper), obcecado com a ideia de que o filho pudesse ser gay, acaba matando o vizinho (Kevin Spacey) por achar que os dois tinham um caso. No final das contas, antes de dar tiros, o coronel tenta beijar o vizinho e é rechaçado. Estranho, não? Mas acontece. O coronel projetava no filho seus próprios desejos reprimidos.
Na semana passada, dia 20 de novembro, a Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara aprovou, sob insistência de Feliciano, a convocação de um plebiscito sobre a união civil de pessoas do mesmo sexo. É que ele não aceita que homossexuais se casem, não quer, já bateu o pé. Lindo. Feliciano pretende fazer o plebiscito coincidir com o primeiro turno das eleições de 2014. Um plebiscito nacional, que seria decidido por maioria simples. Sim ou não para o casamento civil de homossexuais?
Proponho um outro plebiscito, também por maioria simples. Marco Feliciano pode ter as ideias lá dele, defendê-las em casa e até com seus fiéis. Ele já provou que a tolerância com a diversidade passa longe de suas convicções. O que torna uma galhofa nacional seu atual cargo. É verdade que ele tem representatividade em seu rebanho: em 2010, foi o evangélico com maior número de votos no país. O que não faz nenhum bem à imagem dos evangélicos brasileiros.
O plebiscito seria uma pergunta simples. Marco Feliciano tem condição de ser presidente de uma comissão de direitos humanos e minorias do governo? Sim ou não?
Visto na: Época



Amigo torcedor, amigo secador, no país de Caça-Rato, símbolo da sobrevivência e herói do time do Santa Cruz, tudo é diferente da fantasia e da modernidade que tentam nos vender a cada instante, a cada clique, a cada moda. No país de Caça-Rato, o menino Paulo Henrique, 9, nada de braçada no esgoto do canal do Arruda, como na foto de Diego Nigro (JC Imagem), que assombrou o mundo esta semana.

No país de Caça-Rato, alguns, como o próprio jogador, escapam graças ao futebol, ao funk, ao rap, ao pagode. Muitos outros ficam no caminho, caça-ratinhos fadados ao limbo dos refugos humanos ou às balas nada perdidas da polícia --quase sempre morte matada antes dos 30.

No país de Caça-Rato, vale o libelo da música de Chico Science, no rastro das imagens do médico e escritor Josué de Castro (1908-73): o homem-caranguejo saiu do mangue e virou gabiru.

No país de Caça-Rato, as vidas são desperdiçadas, velho Bauman, muito mais do que nos exemplos do teu livro sobre o tema. No país de Caça-Rato só há o barulho dos roedores em sinfonia (wagneriana) com a denúncia permanente das tripas.

Neste país, não se diz estou abaixo da linha da pobreza ou qualquer outra frieza estatística, neste país se diz simplesmente "tô no rato", o mesmo que estar lascado como um maxixe em cruz. O mesmo que estar na pele daquele roedor da fábula de Kafka, o bicho que vê o mundo cada vez mais estreito, sem saída à esquerda e muito menos à direita, restando apenas recorrer à orientação de um gato para não cair na ratoeira. O gato o orienta, civilizadamente, mas o abocanha na sequência.

No país de Caça-Rato, tudo é mesmo diferente. Estádio não é arena, não se sabe quem governa, e o Santa Cruz é muito mais que a seleção Brasileira. É a pátria dos pés-descalços, ouviram do canal do Arruda às margens fétidas e baldeadas.

O dialeto que se fala neste país não entra no Aurélio, mas sim no Liêdo, um sábio recifense, autor, entre outras joias, de "O Povo, o Sexo, a Miséria ou o Homem é Sacana".

A alta gastronomia no país de Caça-Rato tem o aruá, o sururu --já bem escasso e artigo de luxo--, o mingau de cachorro e o caroço de jaca assado na brasa. O rei do camarote neste país sem fronteiras é conhecido como cafuçu, o avesso do playboy, mas uma criatura que capricha no estilo dentro das suas posses. O jogador do Santa Cruz que dá nome a este país é o príncipe dos cafuçus.

No reino de Caça-Rato, o menino que nada no esgoto no canal do Arruda é apenas uma foto que assombra a classe média. Não se fala outra coisa no país de Caça-Rato: que gente mais besta e limpinha, por que tanto barulho sobre uma cena tão repetida diariamente? O país de Caça-Rato sabe que daqui a pouco ninguém mais se lembra. O país de Caça-Rato funciona à prova de padrão Fifa.



Faltam roupas, remédios, leitos. Faltam médicos, anestesistas, enfermeiros.
Falta vergonha.

"Aqui, olha, deixam a gente na musiquinha”, disse a recepcionista do Hospital Barra d’Or, no Rio de Janeiro, apontando para o telefone em viva voz. Ela tentava, sem sucesso, autorização do Bradesco Saúde para Hélio Araújo ser atendido na emergência. Hélio tem 91 anos e é meu pai. Sofreu uma queda em casa, e um armário caiu por cima dele.  Esperava na cadeira de rodas, a mão enfaixada, pingando sangue no lobby do hospital. Não sabíamos se havia fratura da mão ou um dano no crânio. Meus pais pagam R$ 2.440 por mês ao plano de saúde. A mesma seguradora desde 1978.
“Não autorizaram emergência, só internação. Também não autorizaram tomografia cerebral. Estou tentando o raio-X”, disse a recepcionista. “Então pago tudo particular, depois abro um processo”, disse eu. Só assim ele foi atendido, “no particular”, após horas de incerteza. Ficamos no hospital das 20 horas às 4 horas da manhã. Na saída, surpresa: não foi preciso pagar nada. Mas a recepcionista teve de insistir horas, houve discussão e estresse. É o caso de um paciente de elite, que enfrenta os maus-tratos comuns dos planos.

O buraco é bem mais embaixo na saúde pública do Brasil. Sinto náuseas ao ver multidões de pacientes, de crianças a idosos, dormindo em filas diante dos hospitais, com senhas só para “agendar a consulta”, e não para atendimento. As senhas acabam. As pessoas choram. Estão vulneráveis, doentes, frágeis, sentem-se humilhadas, escorraçadas. Gosto de cachorros, mas acho que a sociedade tem se escandalizado mais com o tratamento dispensado a cães do que a seres humanos.

O estado deprimente e indigno de nossa Saúde é o maior atestado de que a ideologia política de um governo não garante o respeito aos direitos básicos escritos na Constituição brasileira. Temos uma década de governo “de esquerda” – já que o PT se considera um partido do povo. O que existe diante dos hospitais é a fila da vergonha. Nossas emergências e nossos postos de saúde estão em colapso.

No Rio, há 12.500 pacientes à espera de cirurgia em hospitais federais. Alguns esperam há sete anos. Os dados são da semana passada, levantados pela Defensoria Pública da União. Os defensores decidiram processar o Ministério da Saúde. Querem um cronograma oficial de cirurgias no prazo máximo de dois meses. Exigem que o ministério pague uma indenização coletiva aos pacientes, de R$ 1,2 bilhão.

Os doentes morrem na fila da cirurgia. Cirurgias vasculares, cardíacas, neurológicas, ortopédicas, urológicas, oftalmológicas e torácicas. Os médicos se descabelam por falta de tudo. Sem parafusos e placas, idosos não podem ser operados num dos maiores hospitais do Rio. Uns pedem material emprestado a outros. De nada adianta. A precariedade é o artigo mais em alta nos hospitais federais, estaduais e municipais. O jogo de empurra entre as esferas de governo é conhecido. União, Estados e municípios se mostram incompetentes e venais na oferta de serviço de Saúde. Levam pacientes à histeria, pelo sentimento continuado de impotência.

O programa Globo repórter da última sexta-feira 13, chamado “Emergência médica”, equivale a um filme de terror. Só que é tudo verdade. Durante 40 dias, primeiro com câmeras escondidas, depois oficialmente, uma equipe de repórteres e cinegrafistas voltou aos mesmos hospitais e postos de saúde da família denunciados há quase três anos pela TV Globo, para ver o que mudara. Nada. Em Belém ou no entorno de Brasília, não importa, a calamidade na Saúde rima com crueldade.

Pacientes dividem a mesma maca, quando não estão no chão. Um médico de macacão atende pacientes coletivamente, como se estivéssemos em guerra. Em março de 2011, em Belém, uma menina, Ruth, morreu na frente da câmera dos jornalistas. Tinha vindo de uma ilha, com uma leishmaniose que virou pneumonia. Não resistiu à falta de estrutura dos hospitais. Médicos diziam que nada poderiam fazer, não havia material nem esperança. Os jornalistas voltaram agora à casa da família de Ruth. Os parentes nunca receberam indenização. Ninguém é culpado jamais.

Faltam roupas para operar no centro cirúrgico. Faltam leitos. Faltam médicos, anestesistas, enfermeiros. Falta salário. Faltam remédios. Falta vergonha.

Minha empregada, Lindinalva Souza, estimulada pelas campanhas do governo de prevenção de câncer nos seios, foi à Clínica da Família em Campo Grande, Zona Oeste do Rio, pedir uma mamografia. Faz quatro meses. “Quando tiver uma vaga, a gente te chama”, disse a agente de saúde. “Por enquanto, só estamos atendendo diabéticos, hipertensos e grávidas.” Que resposta é essa?

E, assim, brasileiros e brasileiras anônimos somem para sempre no corredor da morte, ignorados pelos governos, que gastam nossos impostos com sei lá o quê.

Visto na: Época


           A delicadeza de pessoas que tecem o imaginário masculino citada em livros, poemas e canções: as mulheres. Entretanto, o que era para ser uma continuação histórica regada a pétalas, se transforma em um jardim cercado de espinhos. Essas mulheres que lutavam, e até hoje lutam contra a opressão machista de nossa sociedade, são estigmatizadas por um passado cruel e opressor, o qual, até nossos dias, perpetuam feridas profundas que não sararam durante esses longos, árduos e pesarosos anos.

            Durante muito tempo essa hegemonia do sexo masculino fez parte do cenário de muitas mulheres que chegaram a sofrer opressões por exporem seus ideais. Temos a exemplo, aqui no Brasil, feministas que queriam legitimar seus direitos, como Patrícia Galvão( PAGU), esta que durante o governo Vargas, que em 1934 criou o voto feminino no Brasil, chegou a ser presa por apoiar e fazer uso de práticas “extravagantes” para uma mulher de sua época. Porém, hoje, muitas mulheres, diferentes de PAGU, se calam à voz de um homem e acabam sendo reprimidas por apenas serem do sexo feminino.

            Essa incapacidade moral que muitos atribuem à mulher influencia em diversos âmbitos da sociedade. Situações corriqueiras de mulheres que sofrem violência doméstica e acabam perpetuando isso em um silêncio que lhes maltrata aos poucos. Nos meios culturais, a essência feminina perde seu vigor no machismo impregnado de homens que fazem prevalecer a cultura do sexo. Na política, temos o caso de nossa presidente que foi inferiorizada por muitos; e na economia, vale salientar que a Petrobrás descansa sobre os braços de uma mulher, ou seja, as mulheres têm as mesmas capacidades que os homens.

            Faz-se perceber, ainda, sobre as leis que protegem as mulheres, como por exemplo a Lei Maria da Penha, que pune agressores do sexo feminino. Entretanto, para essa lei ser vigorada, hoje, uma mulher, que foi propulsora dessa lei, se encontra em uma cadeira de rodas por causa da violência de seu ex-companheiro. O que nos refaz a ideia de que para o ser feminino conseguir algo, alguém deve se impor de forma dolorosa.

            Portanto, a igualdade dos direitos às mulheres deve ser legitimado que não possa ser apenas ser falaciosa, sem concretude. Quanto às pessoas do sexo feminino, estas devem, também, conquistar e angariar mais espaços na sociedade, deixando de lado o pensamento machista que muitas carregam sobre si e abdicando a imagem sensível da mulher.

Aluno: Cleston Francisco
Professor: Diogo Didier

Dois garotos caminham de mãos dadas na calçada da avenida mais movimentada da Boa Vista. A cena ainda é pouco comum em outras partes do Recife, mas tornou-se paisagem cotidiana nessa área a partir dos anos 1970, quando o bairro virou epicentro gay. “Homossexuais que assumiam uma postura política sobre sua sexualidade, ainda nos anos da ditadura militar, escolheram a área central da cidade como um território de liberdade”, diz o professor de história Sandro Silva, autor da dissertação de mestrado Quando ser gay era uma novidade: aspectos da homossexualidade masculina na cidade do Recife na década de 1970 (UFRPE). A programação é diária, extensa e diversa, incluindo bares, boates, saunas, cinemas e o shopping que leva o nome do bairro e funciona como ponto de encontro.
Às 16h, várias mesas da praça de alimentação são ocupadas por casais de homens. Diego Ferreira, 19 anos, saiu do trabalho para se encontrar com um paquera. “A gente se conheceu aqui mesmo, há um mês”. Diego frequenta o bairro desde os 16 anos e já demonstra uma certa nostalgia. “Era massa quando tinha a Fun Fashion (bar que também batizou um movimento que tomava toda a Rua do Giriquiti, atrás do Shopping Boa Vista, juntando gays de diferentes tribos, de góticos a emos e malhadões). Toda sexta-feira eu estava lá”. O som — muito alto, que sempre gerava reclamações dos vizinhos — vinha dos carros. A bebida era vinho Carreteiro e cerveja. A festa, quase um carnaval, acabou há cerca de dois anos, quando migrou para a Praça do Arsenal, no Bairro do Recife, aos domingos.



A gerente de loja Karla Diniz, 26 anos, é paraibana de Campina Grande e não chegou a presenciar essas farras porque começou a trabalhar no shopping há um mês. Acabou há pouco uma união de cinco anos com outra garota. Ela costumava frequentar bares em Boa Viagem, perto de casa, mas agora que está solteira já conheceu a maioria dos points perto do trabalho. Conchittas, bar com alta frequência de meninas, é uma das paradas obrigatórias. O público ocupa uma calçada da Rua Manoel Borba, na esquina com a Rua das Ninfas. Basta atravessar a via para ir ao Santo Bar, extensão mais tranquila da Boate Metrópole. Karla também costuma frequentar o Pit Hausen, na Rua do Giriquiti com a Rua José de Alencar. A paquera é sempre bem-sucedida. “Tanto que nem estou mais na fossa”, ri. Na verdade, ela nem precisaria sair do trabalho para conquistar alguém. “Já aconteceu várias vezes de eu estar na loja e chegar uma menina querendo me conhecer, perguntando se sou comprometida”.
Boa parte de quem circula pelo shopping vai ao Pit Hausen, o bar pequeno, com mesas espalhadas pela via, fundado há mais de 20 anos e hoje comandado por Raquel e Chico Caldas. “98% dos nossos clientes são gays”, diz a dona, enquanto cumprimenta os amigos pelos vocativos de “senhora” e “bicha”. Raquel veio de Sertânia para estudar na capital. Como a maioria dos colegas, morava no centro, e vivia intensamente a rotina da Boa Vista.



Raquel fez muitos amigos e, com o pessoal da vizinhança, frequentava o bar, até o dia em que o antigo dono, Gaúcho, que ia voltar para o Sul, decidiu repassar o ponto. “Antes, ninguém podia se abraçar nem se beijar. A primeira coisa que fiz foi liberar geral o beijo na boca”.
Pouco mais à frente, na Rua do Progresso, a sauna Progresso Club é exclusiva para homens, que passeiam pelos ambientes apenas de toalhas. Às 15h, começa o movimento. Do lado de fora, a fachada branca, com varanda gradeada e árvores em volta, não deixa ninguém desconfiar do que se trata. É possível ver apenas alguns senhores na recepção. Entre as atrações, gogo boys, shows, música eletrônica, bar e quartinhos para encontros.
Do outro lado da Avenida Conde da Boa Vista, na estreita Corredor do Bispo, uma travesti imensa, montada num salto 15 e com cabelos bem longos, desfila a calça branca colada e o biquíni cortininha. Entre uma cerveja e outra, é assediada pelos homens que estão em frente à boate MKB (sigla para Meu Kaso Bar). Na boate, às sextas-feiras, há concurso de performances de travestis no palco principal. Na porta da casa, Eva, de peruca morena e vestidinho preto nada básico, recepciona a clientela distribuindo camisinhas. Algumas pessoas não aceitam. “Ai meu deus, tu não usa?”, pergunta Eva, reforçando o discurso de sexo seguro adotado pela maioria dos estabelecimentos voltados para os gays no bairro.
escola de sereias
Nas quartas-feiras, as noites são de karaokê no Santo Bar, embalado por músicas pop. Imagens de santos pintadas nas paredes e até uma fotografia do papa Francisco presenciam a animação na pista de dança, repleta de gente sem vergonha para cantar ou dançar. Ao som da clássica Take On Me, da banda A-Ha, lei nas discotecas que relembram os anos 1980, uma dupla de meninos arrasa nos agudos, enquanto as meninas vibram ao redor.
Na área externa, sentada na mesa, só prestando atenção nas músicas, está Latipha Silvia Castilho de Biasi Montarroyos. Quem olha para o rapaz de boné virado para trás, bermuda e camiseta não imagina um nome tão digno de duquesa. Acontece que Latipha fica “na caixa”, brinca, e só dá a graça da sua presença nos dias de balada. Sua transformação para diva da noite inclui vestido rendado, pérolas, saltos altíssimos, peruca loira e lentes de contato azuis, que deixam o rapaz irreconhecível. Durante a semana, ele deixa os pelos da barba e do corpo crescerem e esconde as roupas e acessórios para produção.  Fica tudo guardado no quarto de uma amiga. “Minha mãe só sabe que eu sou gay, não que eu sou transformista”.
No Facebook, assumiu a identidade da travesti. Todas as fotos são de diva sensual, que cai na farra com tudo a que tem direito, e as postagens seguem o mesmo tom. Sempre no feminino. Nunca quis fazer cirurgia para mudança de sexo e não toma hormônios femininos, porque acha que não adianta mais. “Se eu quisesse ter forma de mulher, tinha que ter começado a tomar aos 13 anos. Para ficar com cintura, afilada. Conheço muita gente que fez”. Na balada, o lugar preferido é o fumódromo, onde passa horas ouvindo casos de vida e dando conselhos. Cada um com um conflito, uma insegurança, um medo. “Essa vida não é fácil. Muita gente tem dúvidas sobre a própria sexualidade, precisa se esconder da família ou depende de algum cara pra viver. É muito comum um gay que vive às custas de alguém, numa situação de completa submissão sexual, afetiva e financeira”, conta. A própria Latipha passou por uma situação parecida quando se mudou para o Rio de Janeiro para viver com um namorado. Diz que apanhava de ficar ferida, marcada, vivia sob violência psicológica e física. “Um amigo me ajudou a comprar uma passagem e a fugir de lá, voltei para cá escondida”.



Toda sexta-feira tem concurso de travestis na MKB

Eva, a recepcionista da boate MKB, também gosta de se travestir, mas com um tom bem profissional. É mais um ator, que se monta na noite para fazer shows de bate-cabelo. Trabalhava em outra boate gay quando foi convidada pelo proprietário da MKB para se juntar à equipe, na época em que a casa foi inaugurada, em 2000. Para fazer a divulgação das festas, ficava nua, só com uma tanga fio dental, distribuindo panfletos no Recife Antigo.
De dia, Eva se chama Fábio, e passeia de bicicleta para cima e para baixo, vestido de homem. “Fico tão discreto que não dá nem pra imaginar que eu sou gay”, ri. Só trabalha às sextas, sábados e domingos. Durante a semana, resolve detalhes de figurino, performance e programação da boate. Na casa onde mora com o namorado, na Rua José de Alencar, na Boa Vista, empilha mais de dez malas só com roupas de travesti. Tem de tudo: pedrarias, brilhos, rendas, bordados. Reforma as próprias roupas, criando várias personagens. Expostas sobre a cama, se enfileiram dezenas de perucas, das mais diversas cores,  incluindo fios arco-íris. Uma para cada estado de espírito.
te encontro na pista
Na Metrópole, na Rua das Ninfas, o clima esquenta. A pista de dança do primeiro andar ferve ao som de brega e pagode. Todos requebram ao som de “encaixa, encaixa, remexe e agacha”, fazendo a coreô da suingueira. “Eles se olham e já sentem se rola interesse ou não. Não tem muito jogo de conquista, é mais pegação mesmo”, diz a gerente da boate, Tereza Montarroyos, que trabalha na casa há 12 anos.  Para quem quer mais privacidade, o destino é o dark room (quarto escuro), onde rola de tudo.



No Pit Hausen, há algumas regras. “Já teve casos de gente transando no banheiro. Se não deixamos muito claro o que é permitido, rolam coisas que não são legais. Fico de olho, para o pessoal não extrapolar”, diz Raquel Caldas. O amigo Cláudio Coutinho, de 48 anos, que trabalha numa empresa de turismo, frequenta o Pit Hausen quase todos os dias. É assíduo na Boa Vista desde que era aluno do Colégio Militar do Recife. Quando era mais novo, os olhares controladores na rua impediam a livre expressão. “Ainda assim, era nessa parte da cidade que ficavam os lugares onde podíamos assumir a sexualidade”, conta. “A boate Fefé era fina, por trás do Cine São Luiz. Ao lado da Dorinha, mais simples, onde todo mundo se soltava”.
Ele lembra de várias outras opções, como a lendária Misty, que funcionou de 1979 até 1993. A primeira versão ficava na Rua do Riachuelo.  Depois, a boate se instalou onde hoje fica a Metrópole. O Da Zi Bao, na Rua do Progresso, fazia sucesso por conta do bar no quintal, com árvores e local para namorar. O Mangueirão, perto da Unicap, tinha um clima vespertino, tipo matinê. E muita gente ainda recorda da boate Dalí, em cima do Pit Hausen, e do Poção Mágica, na Rua José de Alencar.  “A gente catava aqui, catava ali, não tinha isso de ficar a noite inteira no mesmo lugar”, lembra Cláudio.



Cláudio Coutinho é frequentador assíduo da Boa Vista. Adora o clima do bairro e não dispensa uma cerveja no Pit Hausen

Apesar da história gay do Mustang — o bar era uma referência neste cenário até 2005—, os donos do bar, fundado em 1969, preferem não associar sua marca a esse público. Uma das proprietárias, Vanessa Souza, disse que o local, na Avenida Conde da Boa Vista, nunca ofereceu atrações específicas para homossexuais. “E se a gente recebia muitos gays, não fazia muita diferença para o bar, porque ninguém era assumido. Eram frequentadores como qualquer outro”, afirmou. “Estamos criando uma atmosfera familiar. Colocamos ar-condicionado e parquinho”. Em 2005, em frente ao bar, cerca de 200 pessoas se beijaram em forma de protesto: um casal de lésbicas havia sido expulso do Mustang por estar se beijando. Na época, um dos donos do bar, Wellington Carlos, pai de Vanessa, informou que elas estavam constrangendo os clientes e que, em mais de 30 anos de bar, nunca havia existido situação parecida. Desde então, a relação entre o bar e o público gay anda abalada.

Visto na: Aurora

15 dezembro 2013



Ao pensar no armário, lembra-se instantaneamente de um local onde se guarda coisas. Fugindo dessa óbvia conceituação, metaforicamente o armário também serve de lugar para se esconder os mais periculosos segredos. Aqueles que podem denegrir a imagem do indivíduo, caso seja revelado. Durante anos, e até nos dias de hoje, é lá que se guarda um dos maiores tabus da humanidade, a sexualidade. Esta que, quando foge do padrão, deve ser guardada a sete chaves. Se possível com trincas bem fortes, cadeados, correntes e, caso haja modernidade, vale também um sistema de monitoramento computadorizado e com uma senha indecifrável.

E porque esconder a própria sexualidade? Quando se trata da homossexualidade, os motivos são infinitos. Esconde-se por causa do preconceito familiar, da rejeição. Esconde-se para manter o cargo tão desejado. Esconde-se para continuar indo ao futebol, a igreja, as reuniões com os amigos héteros nas mesas de bar. Esconde-se, portanto, para se manter uma rotina social nesse universo dominado pela heteronormatividade. Então, revelar-se gay é o mesmo que perder tudo isso, para um indivíduo comum. Mas, quando ele é famoso, parece que as perdas são maiores. Vai da falta do tão sonhado prestígio ao tão cobiçado, mas pouco vivido, respeito.

Sempre que surgi uma polêmica em torno da sexualidade de alguém, isso acaba sendo manchete de jornais e virais nas redes sociais. Parece que o simples fato de não seguir a risca os padrões heteronormativos sentencia o indivíduo ao cárcere social, servindo de alvo para chacotas e especulações alheias. O pior de tudo é quando a pessoa em questão tem uma imagem pública. Para estas, por exemplo, assumir uma talvez homossexualidade resulta na auto exclusão e/ou redução a grupos específicos. Reduzir, nesse sentido, significa polarizar os artistas entre aqueles que correspondem ao grupo dos héteros e os do não héteros, ou de sexualidade “duvidosa”. Sem contar que, quando há incerteza nesse tocante por parte de uma determinada celebridade, o público instantaneamente revela seus preconceitos que pareciam embalsamados.

Há poucos dias, o cantor sertanejo e ídolo de muitas adolescentes, Luan Santana, teve sua integridade posta à prova nas redes sociais. A questão envolvia o cantor e o seu personal trainer, que segundo as más línguas, estariam tendo um caso. Semelhante a isso, outros artistas tiveram sua sexualidade na berlinda. O cantor Júnior, que fazia par com a sua irmã Sandy, já foi alvo de comentários desse tipo. Outra cantora, dessa vez Luiza Possi, foi questionada se estaria tendo um Love affair com a cantora, assumidamente gay, Maria Gadú. E não faltam exemplos: Ivete Sangalo com Xuxa. Ray com Zeca Camargo. Marlene Matos mais uma vez com Xuxa. São tantas as suspeitas, mas tão poucas as evidências que só resta um questionamento: e se eles fossem gays mudaria alguma coisa?

A resposta infelizmente é sim, mudaria. A mudança reside no velho preconceito que existe em torno da homossexualidade. Mesmo sabendo que no meio artístico a homossexualidade, bem como a homoafetividade, rolam soltas, ninguém está disposto a aceitar a orientação sexual do seu artista como de fato ela é. Quando a aceitação acontece acaba aparecendo os guetos, onde pequenos grupos que são diferenciados dos demais gêneros musicais se encontram para curtir sua celebridade favorita. Ouve-se, então, que os fãs da Ana Carolina são predominantemente gays. Enquanto os do Marcelo D2, por exemplo, são héteros. Será que ninguém se perguntou o porquê dessa polarização? Simples, porque o preconceito da sociedade infiltra-se no seio artístico de uma forma que mesmo admirando um determinado ídolo, muitos temem ser identificados como alguém próximo da homossexualidade porque ouve, canta e gosta de um determinado cantor, o qual é assumidamente gay ou no mínimo bissexual.

Com isso, muitos artistas preferem esconder sua própria condição sexual a ter que fragmentar seu público. Porém, nem sempre o armário consegue conter a homossexualidade contida em cada um deles. Sempre há uma perna fora do lugar. Um braço que escapole. Uma pluma que voa sem querer. Seja como for, não há escapatória. E o público “fiel” não perdoa. Ataca nas redes sociais assim que alguma dúvida surgi. Manda emails ora reclamando ora pedindo explicações. Deixa de ir aos shows e de comprar os CDs e DVDs do seu “artista favorito”. Quando não, segue seu ídolo, programa ataques verbais na rua e até agride se for o caso, pois a mente psicótica de algumas pessoas, o seu artista não pode ser gay. Tudo por causa de uma suspeita infundada, a qual nada vai interferir no talento que determinada celebridade possua.

Nesse ínterim, percebe-se que a polêmica ganha maiores proporções quando direcionada a celebridades masculinas. Tanto faz ser ator, apresentador, cantor, jogador de futebol, ou modelo, o ideal é que seja hétero. O discurso ignorante e implícito diz que os gays não pertencem a essa atmosfera. E, se caso pertençam, devem ser feios ou no mínimo engraçados para compensar. Artista masculino bonito tem que ser macho, pois neste caso a beleza também é reduzida a questão de gênero. Por isso que o cantor Luan Santana vem sendo alvo de críticas por causa de uma possível homossexualidade. Ele que é famoso, rico e bonito, não pode ter acrescido a essa lista o adjetivo gay, pois isso seria um descrédito a tudo o que ele lutou para conquistar até hoje.

Nesse tocante, ser gay parece anular os talentos do ídolo, pois para ser símbolo midiático não pode ser homossexual. Tem que ser hétero, viril, pegador e com cara de cafajeste, feito o ator Caio Castro. Ou, se for mulher, bonita, inteligente, comportada, boa dona de casa, como a apresentadora Angélica. Não que essas últimos papéis nãos ejam importantes, mas isso não significa ofuscar os tangenciar os outros. Na história brasileira, muitas foram às celebridades que assumiram sua homossexualidade e que deixaram um grande legado para sua e outras gerações. Nomes como Cazuza, Cássia Eller, Renato Russo, são alguns exemplos pontuais. Em vida, nomes como Maria Gadú, Ana Carolina, Daniela Mercury, Adriana Calcanhotto, são outros. Mesmo essa listagem sendo predominantemente feminina por causa do machismo operante, sabe-se que muitos são os artistas que vivem no limbo, seja na música ou na teledramaturgia. Seja como for, o fato de serem gays, bissexuais ou héteros não é argumento suficiente para reduzir seus talentos e seus legados. Contrariamente a isso, muitas dessas e outras celebridades que virão estão cheias de talentos, capazes de clarear o obscuro preconceito que neblina as mentes desses falsos fãs.

Fãs esses que fazem jus ao fanatismo, etimologia da palavra que lhe deus origem. Cegos por um ideal idólatra, eles não conseguem enxergar seu amado ídolo como um ser humano qualquer: que sofre, sente desejos. Que é hétero ou gay, ou pode ter dúvida nesse sentido (Por que não?!). Contrário a isso, pois hipnotizados pela indústria midiática, a qual vende muitas vezes produtos irreais, eles, os fãs, não aceitam que seus ídolos mudem “de repente” sua sexualidade e, impiedosamente guilhotinam o seu artista favorito para que ele sirva de exemplo para os outros. Intimidados, muitas celebridades guardam sua real sexualidade, e outras coisas humanas, no armário, pois sabem, ou foram abruptamente avisados que caso fujam do padrão perderão tudo o que conquistaram: a fama, a riqueza e o amor dos seus amados e compreensíveis “fãs”. Sem ter para onde fugir, só resta a essas pessoas viver uma vida de aparências o mundo imaginário de ilusões de indivíduos que foram criados e replicados para apenas gostar do que é padronizado. Felizmente, alguns artistas conseguem enfrentar toda essa barreira de preconceito e viver como de fato a vida deve ser vivida: livre e feliz. Por mais que essa liberdade e felicidade não façam parte daquilo que se convencionou chamar de “normal”.


“No Brasil, tudo vira moda. Até manifestação de rua.”

Ouvi essa frase de um motorista de táxi durante os acontecimentos de junho, e achei um exagero. Rebati, dizendo que o povo nas ruas tinha um significado imenso e ia propiciar a mudança de várias leis. Ele me olhou pelo retrovisor e respondeu que era verdade, mas que via muitos jovens, a caminho das manifestações, agindo como se estivessem indo para um bloco de carnaval. “É a onda do momento”, insistiu. “Daqui a pouco passa.”

Em poucas semanas, as manifestações começaram a esvaziar. Os motivos eram muitos: a ação dos black blocks, as depredações, a violência da polícia, as denúncias de interesses escusos por parte de políticos, milicianos, traficantes. Mas não pude deixar de pensar nas palavras do motorista de táxi.

Tornei a pensar nelas há algumas semanas, ao voltar de uma viagem de quase um mês à Alemanha. Ao desembarcar no Brasil, fui tomada pela sensação de que somos mesmo um país de modismos. Um povo fútil. Sei que é um clichê essa história de ir à Europa e voltar falando de “um banho de civilização”. Sempre fui contra isso. Mas, desta vez — depois de visitar 11 museus, duas exposições, de ir a um concerto de música clássica e de visitar uma gigantesca feira de livros —, alguma coisa aconteceu comigo.

Acho que uma das razões dessa sensação foi a leitura, durante a viagem, do livro de Mario Vargas Llosa, “A civilização do espetáculo”. Embora em alguns pontos eu discorde do escritor, o livro me chamou a atenção para a destruição da cultura no mundo moderno, em favor do entretenimento. Esse conceito me deixou pensando no Brasil — nesse país que não lê livros, mas onde quase todo mundo tem celular. Onde se veem, nos bairros pobres, antenas parabólicas sobre casas miseráveis, onde há mais televisores do que geladeiras, e onde, em vez de bibliotecas, temos lan houses. País que parece ter passado, em massa, do analfabetismo funcional para o Facebook — sem escalas.

Outro fator que contribuiu para a minha sensação, ao voltar, foi essa lamentável discussão sobre as biografias. Muito me entristeceu ver biógrafos e historiadores serem tratados como se fossem caçadores de fofocas, quando o que está em jogo, com essa distorção no Código Civil, é a memória — e a História — de nosso país. Lamentei ver artistas que sempre lutaram pela liberdade defendendo posições indefensáveis. Não pude deixar de comparar o que estava acontecendo aqui com a atitude dos alemães em relação ao seu próprio passado (e que passado!). Eles não escondem nada. Não são um país sem memória. Tinham todos os motivos para ser, mas não são.

Nós somos. Descuidamos de nossos museus, nosso patrimônio, nossos arquivos. Deixamos cair aos pedaços a Biblioteca Nacional. Mas adoramos automóveis. E televisores gigantes, com telas de LED. Não podemos ficar um segundo sem falar ao celular, nem mesmo quando almoçamos (na Alemanha, os trens têm vagões em que é proibido ligar celulares e computadores, porque os bips incomodam). Quando viajamos — refiro-me à nossa classe média —, o que mais gostamos é de fazer compras. Já somos até conhecidos nas lojas de Nova York e Miami, onde os lojistas contratam vendedores que saibam falar português. E somos vaidosos. Queremos espetar botox no rosto e botar silicone nos seios. Já há meninas de 14, 15 anos, pedindo às mães que as deixem fazer isto. Nas ruas da Europa, não se vê essa quantidade de seios artificiais que temos por aqui. Estamos entre os campeões mundiais em número de cirurgias plásticas. Em cidades como Rio e São Paulo, há quase uma academia de ginástica em cada quarteirão. Precisamos malhar. E emagrecer. E não envelhecer nunca. E comprar tênis novos. Mas podemos passar um ano inteiro sem ler um único livro. Temos péssimos resultados em matéria de educação — em todos os sentidos.

Voltei da viagem com essa sensação de que somos mesmo fúteis, superficiais, e me lembrei do motorista do táxi.

Visto no: O Globo


A verdadeira felicidade. O que é? Onde encontrá-la?
Porém, será que estamos buscando felicidade na direção que irá produzí-la?

Felicidade em sânscrito é sukha. O termo sukha indica uma noção de bem-estar, um estado de ser, de estar, de viver e se relacionar com o mundo ao redor.
Um profundo bem-estar não é algo construído, passageiro, dependente de outros fatores externos, como a sensação de felicidade que se tem ao comer uma comida saborosa, ganhar um presente ou desfrutar da presença de bons amigos.
Saberemos se estamos verdadeiramente felizes quando estivermos sós, sem nada a nos agarrar, sem nenhum objeto de suporte que ative sensações agradáveis. Simplesmente estando consigo, inspirando e expirando, desfrutando da presença natural de nosso ser além de qualquer artifício do ego.
Esta felicidade não é meramente uma disposição de ânimo pois nada é necessário para que encontre-se disposta a florescer. Não há nada que a bloqueie ou impulsione. É o que é, livre de todas nossas construções e projeções mentais. É chamada de o “Grande Bem-estar” ou a “Grandiosa Bem-aventurança” (maha sukha em sânscrito).
Não há como obtê-la, pois não é uma construção de nossas mentes. É um estado de ser presente por de trás do cenário do filme de nossas vidas, a natureza da própria qualidade luminosamente refletora que projeta as imagens na límpida e translúcida tela de nossa mente-coração. Esta felicidade ocorre naturalmente ao desatarmos os nós criados por nossa mente, condicionamentos, impressões de hábito, formas de perceber a nós mesmos e a realidade ao nosso redor.
Nosso ser pede por harmonia, busca por paz e contentamento. Porém, constrói as causas contrárias. De forma geral, ainda que venhamos a buscar por verdadeira felicidade, nutrimos as causas para a agitação, stress, depressão e tristeza em nossas vidas. Vivemos os medos do passado e as expectativas do futuro. Esquecemos do presente e entramos em uma viagem sem fim repleta de ilusões e criações mentais dessintonizadas com o momento onde as coisas realmente estão acontecendo: agora.
Paramos alguns instantes. Respiramos profundamente. Relaxamos nosso corpo. Tranquilizamos nossa energia. Acalmamos nossa mente. Percebemos que nosso corpo agradece. Que nossa energia dá sinais de bem-estar. Reconhecemos que nossa mente se destenciona e levemente se abre. Vamos respirando e acalmando, desfrutando do momento presente, exatamente onde estamos, na caverna de retiro que nada mais é do que o próprio ambiente de nossas mentes. Desenvolvemos a prática espiritual que essencialmente é o nutrir bons pensamentos e o se desinteressar por tudo aquilo que não produz o que buscamos verdadeiramente – equilíbrio, tranquilidade, amor e lucidez. Gradualmente, vamos cultivando o repouso tranquilo, consciente, em paz – paz-cientes. Vamos reconhecendo a natureza deste momento, suas qualidades e potenciais extraordinários. Construtos do passado e do futuro não encontram suporte junto a este desfrutar natural, este florescer auto-surgido. O passado já passou. O futuro ainda esta por vir. É no presente que semeamos o futuro. Este exato momento é o lugar e tempo mais importante de nossas vidas. Viver cada instante, cientes do desenrolar de nossa consciência no aqui e agora, cultivando as causas de nosso bem-estar, transformando nossa forma de olhar para o mundo e para nós mesmos, nos familiarizando com quem realmente somos é a direção de nossa felicidade verdadeira.
Isto é a essência de uma vida saudável, repleta de contentamento, apreciação a cada passo, alegria a cada instante. É estarmos florescendo a cada momento, a cada olhar, a cada sorriso, a cada escuta, a cada troca. A felicidade genuína esta muito próxima. Basta ser nutrida, reconhecida e familiarizada para que se torne uma continuidade de ser, estar, viver e fluir na vida.
Lama Jigme Lhawang é um lama (guia espiritual) na Linhagem Drukpa do budismo Himalaico ordenado pelo líder e autoridade máxima da linhagem, S.S. Gyalwang Drukpa. É também o fundador e diretor espiritual da Comunidade Budista Drukpa Brasil. Formado com bacharelado em Estudos Budistas e Línguas Himalaicas pela Kathmandu University, atua como tradutor oral e literário da língua tibetana. É especialista na área do equilíbrio emocional e do cultivo da atenção plena e é professor formado e autorizado pelo Cultivating Emotional Balance (Cultivo do Equilíbrio Emocional), um programa de formação baseado em evidências científicas originado através de encontros de S.S. Dalai Lama com renomados cientistas ocidentais e fundado pelos professores Dr. Paul Ekman e Dr. Alan Wallace.

Visto no: Sobre Budismo