29 junho 2014



Sempre que escuto a expressão “vai tomar no cu” me pergunto o porquê de tamanha afetação. A rigor, a intenção de quem direciona essa frase a alguém consiste em reduzir o alvo a nada. Ou melhor, a merda, visto que este último representa a extensão do ânus, codinome cu, por onde sai tal excremento. Mesmo sendo usado como palavrão, nem sempre quem recebe essa ofensa se sente incomodado. Certa vez ouvi que o problema não é a palavra, mas sim o tom que ela é proferida e a quem se destina. Nesse sentido, sinto que ao mandar alguém tomar no cu, de forma agressiva e por vezes deliberada, estamos perdendo tempo, pois em muitos casos não é uma ação negativista. Se caso fosse tão ruim tomar nessa região do corpo, o Brasil e o mundo não estariam repleto de homens e mulheres dispostos a se entregar ao deleite desse orifício.
Símbolo democrático mundial, o cu é uníssono. Está em toda a humanidade e é vital para a sua existência. Como o homem sempre buscou meios de satisfazer seus prazeres sexuais, muitas vezes transgredindo regras morais, sociais e religiosas, e até reconfigurando a funcionalidade do seu corpo, o cu ganhou outras dimensões e usos. Como é sabido, ele serve, a priori, como veiculo de eliminação dos nossos alimentos, por meio do nosso aparelho digestório. Entretanto, a humanidade atribuiu a ele o status sexual, do qual boa parte dos nossos desejos é concretizada. E por mais que se tenha criado uma cultura de nojo ou repulsa em torno dele, não podemos negar que há muitas vezes nesses discursos um quê de hipocrisia, visto que na cama, tal região é cobiçada como se fosse um manjar dos deuses.
No Brasil, por exemplo, mandar alguém tomar no cu é de uma indecência sem medida. Eu diria até que de uma burrice imensurável. Num país onde as mulheres são glorificadas e tem suas bundas esquartejadas do resto do corpo, parece que aquele palavrão é dito em vão. Principalmente porque por aqui o corpo é corporificado, e por isso reduzido a bunda. Ela é, na realidade, o eufemismo do cu. Não dizemos que ele, o cu, é o símbolo cultural brasileiro (assim como a cerveja, o samba, o carnaval, etc.), porque fomos educados a sermos eufêmicos nesse sentido, e por esta razão, mentirosos. Trocando o cu pela bunda, mantemos essa mentirinha perversa que enaltece o todo e vulgariza a parte. Essa metonímia soa incongruente visto que, no seu íntimo, o brasileiro quer o cu, deseja ele, anseia por descobri-lo, prova-lo, rompe-lo, portanto, num ato de “desfuncionalizar” sua atividade primaria.
Você deve estar se perguntando por que nesse texto eu não fui mais eufêmico utilizando a palavra ânus no lugar de cu. Simples, para naturalizar o que já é natural. Às vezes os eufemismos são interessantes porque suavizam coisas que precisam ser levemente ditas para não macular a integridade do outro. Entretanto, quando se trata do cu em questão, os eufemismos são desnecessários, pois não há agressão em dizer algo que já está inserido na nossa rotina e nosso corpo há tanto tempo. Talvez o problema não esteja na palavra, nem no seu bom ou mau uso, mas na entonação dada a ela. É por isso que outros palavrões, derivados do cu como “vai se fuder”, soam mal, porque são ditos bruscamente em situações onde imperam a violência. Em outros contextos, ditos de outras formas, ele soa tão delicado como receber uma rosa. Também não há problema em se pronunciar cu. O perigo reside quando não cuidamos do nosso e queremos dar pitado no dos outros, como se o nosso fosse imune a algo ou tivesse alguma diferença especial.
E não há pecado ou ojeriza que pormenorize tal ato. Quando o homem ainda era primitivo, ao acasalar-se com outros de sua espécie, não verificava se era homem ou mulher, se havia ânus ou vagina. Ele simplesmente se lançava em cima do outro para saciar suas vontades, independente do orifício que iria ser adentrado. É por isso, também, que a aversão aos homossexuais denota incoerência. Muito antes da ideia da homoafetividade, antes mesmo do racionalismo humano criar forma, nossos antepassados cruzavam-se sem o ostracismo em torno dos papeis de gênero masculinos e femininos. Ou seja, se a sociedade atual, repleta de preconceito contra os gays, tivesse mais um pouquinho de conhecimento, saberia que a prática anal não se limita só aos gays.
Ainda sobre essa questão, o ânus é inferiorizado, por vezes demonizado, por compor as práticas sexuais dos homossexuais masculinos. Em meados de 1980, por exemplo, com a eclosão do vírus da AIDS, os gays foram crucificados pela propagação dessa doença, já que se acreditava que ela era transmissível apenas entre eles. Felizmente, esse pensamento foi sendo modificado com os avanços científicos e culturais da sociedade, uma vez que não é só pelo ânus que se contrai tal enfermidade, mas através de qualquer ato sexual desprotegido e promiscuo. Ou seja, mesmo sendo um dos maiores focos de contagio dessa doença, o cu não é o vilão das doenças sexualmente transmissíveis como se imaginava. O problema residia mais num tabu em torno do uso dessa parte do corpo do que na homossexualidade, pois há quem acredite que ser gay necessariamente tem que dar o cu, quando na verdade, as relações homoafetivas não se resumem a isso.
Toda essa discussão ainda acontece porque existe todo um histórico em torno do cu, entre positivismos e mais negativismos, geralmente relacionados a uma indústria pornográfica, a qual lucra horrores com as nossas limitações. Quando falo de indústria, não e refiro apenas à clássica pornô, responsáveis pelos folhetins e filmes do gênero. Me refiro, sobretudo, a mídia televisiva com suas  mulheres turbinadas do pé a cabeça, especialmente na bunda. Nesse sentido, vale pontuar a cultura musical, a qual tem a bunda (leia-se cu) como epicentro de suas rimas, geralmente pobres, impulsionando a sociedade, que se diz “enojada” com o cu, a rebolar até o chão em coreografias que vão da boquinha da garrafa até o quadradinho de oito. Seja como for, nas baladas, esse povo que se diz careta já segurou o “tcham”, talvez dance de cabeça pra baixo nas noitadas ou, em quadro paredes, faz coisas com a bunda que prefiro nem comentar.
Outra, da tantas incoerências vividas pelo cu, ocorreu há pouco tempo por aqui. Diante de uma multidão que assistia ao jogo de abertura da copa do mundo de 2014, a nossa Excelentíssima presidente Dilma foi alvo do berrante verso: “Ei, Dilma, vai tomar no cu!” dito em alto e bom som para o Brasil e o mundo ouvirem. Ora, os torcedores que se acharam espertos ao manda-la tomar no cu, não imaginavam que tal frase saiu pela CUlatra, visto que nessa copa milionária, quem está e vai tomar no cu somos nós, e o pior, sem prazer. Entretanto, guardada as devidas proporções, é importante lembrar que o cu geralmente é utilizado em ambientes esportivos como forma de ferir seu oponente ou porque culturalizou-se que nos campos é palco de pessoas selvagens movidas apenas pela paixão pelo seu time, a qual permite esse tipo de vocabulário. Pode até ser, mas não deixa de ser pejorativo, não por ser um palavrão, mas por guardar em seu íntimo a ignorância de um povo que repudia o cu, mesmo utilizando dele de diversas formas.
Nesse âmbito, ir tomar no cu é ruim pra quem? Isso vai depender de quem está mandando e de quem está recebendo. Há uma relatividade que merece ser pontuada. Baseado nisso, deveria existir um respeito maior para o cu, pois ele representa o único elo que nos une diante de tantas diferenças naturais e impostas que insistem em nos separar. No filme brasileiro Tatuagem, há uma cena que corrobora com a máxima anterior dita, quando em certa parte dos atores cantarolam o seguinte trecho “a única coisa do nos salva, a única coisa que nos une, a única utopia possível é a utopia do cu” e continuatem cu, tem cu, tem cu...”. Nesses versos satíricos há muito mais do que vulgaridade, para os olhos moralistas dos sórdidos puritanos. Há inúmeras verdades a serem reveladas a partir dessa pequena fenda tão estigmatizada e, ao mesmo tempo, tão desejada.
O cu é utópico porque subverte a normalidade e estagna a procriação da espécie. E nisso ele é altamente positivo, pois contem a inchaço social de um país onde a multidão vive na miséria. O cu é também libertário, visto que mesmo vivendo na clandestinidade, é livre nas transações mais comuns da nossa vida levando prazer aos mais necessitados. É constantemente ofertado como relíquia por muitos e recusado por poucos. Ele é, ainda, a deflagração do um prazer, por muitos pecaminoso, mas que é santificado no gozo reverberado entre os casais. Ele é puro, humano, natural e, por isso, necessário. Vive entre o bem e o mal. Na luz ou no apagar delas nos quartos de motel em nas suítes residenciais. Isso na hora do sexo se decide. O cu é controverso, pois mesmo sujo, é cobiçado. Então, antes de ofender alguém, antes de sentenciar quem quer que seja, é bom se lembrar do dito que diz: “pimenta no cu dos outros é refresco!”, pois só assim lembraremos que antes de tudo, temos algo que nos iguala, o cu. E tanto o seu, quanto o da Dilma, o meu e de quem quer que seja, merecem respeito.


Antes do preconceito é preciso haver humanidade

           A mulher que aborta é um monstro sem coração. Essa frase é comumente utilizada por religiosos e pessoas que descordam do aborto. Todavia, é preciso averiguar o que leva tantas mulheres a cometerem tal ato. A violência sexual e situação econômica precária, são fatores muitas vezes ignorados pelos que sentem-se no direito de julgar.
          Casos de abusos sexuais fazem parte das principais causas de aborto. Entretanto, diferente do que se pensa, nem todas as mulheres são violentadas por desconhecidos. Existe um ditado que diz: "Em briga de marido e mulher ninguém mete a colher." Em contrapartida, segundo dados de meios midiáticos, a cada 12 segundos uma mulher é estuprada no Brasil; mais de 70% desses crimes acontecem dentro de suas casas por parte de seus companheiros. Diante disso, torna-se desumano privar essas vítimas de um aborto digno e com garantia de segurança.
          Lamentavelmente, o que se observa é a valorização dos que possuem boa situação financeira e a negligência para com os carentes. Mulheres que têm dinheiro buscam clínicas particulares para fazer o procedimento abortivo. Porém, as mulheres pobres procuram aborteiras ou tentam encerrar a gravidez se utilizando de chás, tesouras e até espetos como únicas alternativas.                                                 
           Prova disso, é o fato da maior parcela dos leitos voltados para o setor ginecológico dos hospitais públicos, ser ocupada por mulheres vítimas de um aborto mal sucedido. Vale salientar que pessoas não recorrem a esse procedimento por pura crueldade. O fazem por conta de traumas de uma violência sexual, ou mesmo por perceberem que a criança não poderá ser educada, nem alimentada devidamente, graças à situação financeira da família.
           Dessa forma, é preciso rever nosso preconceito para com as mulheres que abortam. O Estado, através do Sistema Único de Saúde(SUS), deve garantir o atendimento digno a essas mães, e ofertar procedimento abortivo de forma humanizada. Fazendo isso, a taxa de mortalidade consequente de abortos clandestinos será reduzida, e a ilegalidade dizimada.
 
Aluno: Nailson Monteiro
professor: Diogo Didier 
         

Ou como comunicar, dialogar e mobilizar a partir dos interesses atuais do público.
 
A cena é a seguinte. Uma pessoa chega a uma festa, dá uma olhada e se interessa por outra. Interessa-se muito – “Nossa, que pessoa interessante. Eu preciso ficar com ela!”. Esta pessoa então se aproxima daquela que é seu “objeto de desejo” e, sem meias palavras, dispara: “Oi, vamos transar?”.
 
Certamente a pessoa desejada foge, lhe dá um tapa, a ignora ou chama o segurança. Óbvio, certo? Nem tanto. Muitas vezes, é assim que a comunicação de interesse público, altermundista e popular lida com seus públicos. Temos assuntos, causas e informações tão importantes, esclarecedoras e empoderadoras que nos parece muito simples dispará-las, com pouca ou nenhuma mediação com os hábitos de mídia, ou os conhecimentos, atitudes e práticas do nosso “público-alvo” – sim, é como alvos que ainda os tratamos.
 
Uma coisa é comunicarmos para militantes e politizados – compartilhar informações, encaminhamentos, ativar engajamento e, sobretudo, manter a galera motivada. Outra coisa é sensibilizar aqueles que estão fora desse circuito, os que não te conhecem ou que discordam das suas ideias – a grande maioria das pessoas, claro. E outra coisa ainda é confundir o segundo público com o primeiro.
 
A comunicação transformadora e mobilizadora deveria ser, antes de tudo, dialógica, criativa e persistente – mas não ansiosa. Comunicar para os “não-convertidos” (quase todo mundo) é perceber que o juízo de valor que eles dão para sua mensagem é a mesma que dão para a novela ou para o jornal sensacionalista. Sim, o público não está nem aí pra você. Ele sempre fará escolhas baseadas nos valores que constrói durante a vida, ou, no máximo, influenciado por quem ele confia. Se sua mensagem não se enquadra nisso, o público nem saberá que você existe. Simples assim, mas pode ser pior, se sua mensagem não souber travar a guerra de memes que vivemos nas redes sociais. Aí, ele já “conhece” sua mensagem e não quer ouvir falar dela.
 
Cupidos e fermentos
 
Existem coisas que o marketing inventou (e são suas ferramentas), e outras que ele descobriu (pertencem a todos, embora por vezes desprezadas por nós e capturadas por eles). Uma dessas descobertas é que a “guerra pelos corações e mentes” se dá na cabeça do público – a tal teoria do posicionamento. Ou seja, não se conquista o público sem conectar-se com seus seus valores, com o que ele acredita que vale a pena (ainda que para transformar essas visões). Não, informação “racional” não costuma convencer as pessoas – a gente não pára de fumar, de dirigir ao telefone e proliferar dengue mesmo sabendo dos perigos dessas práticas, certo?
 
Dessa forma, nossa comunicação precisa ser CUPIDO e FERMENTO. Cupido, porque cabe ao comunicador (profissional ou não) modelar nosso discurso para os ouvidos de quem queremos tocar. Assim começa a conversa que pode virar namoro. Nossas narrativas precisam ser capazes de fazer pontes entre nossos objetivos e os valores e aspirações das pessoas comuns que queremos engajar. “Ah, mas aí estaremos alternando nossa mensagem, perdendo nossa autenticidade”. Bom se você pensa assim, vai lá e diz pro seu público que você quer transar com ele!
 
E fermento, porque, por um lado, o capital tem maior capacidade de frequência midiática (grana pra repetir “compre batom” até você comprar). Mas por outro, nossa mensagem é distintiva e transformadora. Assim, temos que nos concentrar na nossa capacidade criativa para, com poucos recursos, criar ações que “megafonizem” nossa mensagem – e aí vale humor, a guerrilha e a tecnologia. Vale emocionar.
 
Que tal se ao invés do “oi, vamos transar”, a gente não preparasse melhor nossa abordagem? Quem tal entendermos o que nosso público quer? Buscar o que nossa mensagem tem a ver com essas percepções de valores e começarmos apenas puxando o assunto? Às vezes, apenas conseguiremos deixar uma pulga atrás da orelha, enfraquecer a certeza contrária. Deixe ele ir – nada de puxar pelo braço ou pelo cabelo, pra roubar aquele beijo que seu público não quer te dar, ainda.
 
Superando o ativista romântico e o caridoso
 
Nosso pecado tem sido usar nossas oportunidades de comunicação com ansiedade, na base do “me deixa falar!”. De quê adianta falar, se você não vai ser ouvido por quem importa? Talvez a gente possa entender isso através das semelhanças entre o ativista romântico e o caridoso. Afinal, quem dá sopa para morador de rua não quer, de fato, resolver o problema do sujeito. Quer resolver seus problemas de consciência, quer dormir tranquilo porque “Deus viu que eu ajudei o próximo”. Da mesma forma, o militante romântico vive no seu mundo ideal e não quer negociar com o mundo real, limitado e sem garantia de vitória. Ele também quer contar pro seu travesseiro tudo que fez pela revolução hoje.
 
Ambos, conscientes ou não, querem usar o mundo para dele extrair o significado das suas vidas (bacana), e não empenhar sua existência para transformar, de fato, a realidade (melhor ainda!). E aí, tem que negociar com o mundo como ele é para transformá-lo no que de melhor ele pode ser.
 
Luis Henrique Nascimento é comunicador popular, assessorando sociedade civil e governos desde o século passado
 
Fonte:Ninja


O aborto vai além da questão moral

      Mesmo com o advento da Revolução Sexual,nos anos 60,e a chegada de novos métodos contraceptivos,o aborto ainda é comum nos dias atuais.O ato abortivo é praticado entre mulheres que desejam,por motivos diversos,interromper a gestação,negligenciando a vida da criança.Contudo,tal prática é feita de forma clandestina e coloca também em jogo a vida da mãe.Indo em contra uma sociedade machista e princípios religiosos,a mulher que realiza o ato é julgada de crimiminosa por querer ter autonomia sobre o corpo fazendo o que achar melhor para si.

     Apesar do Brasil apresentar um caráter democrático,o ato abortivo é proibido por lei,diferente de outros países como a China que legalizou essa prática visando o controle de natalidade.Muitos são os motivos que levam centenas de brasileiras a abortarem,desde uma gravidez indesejada até fatores econômicos que podem influências no desenvolvimento da criança pela falta de condições financeiras.

      O aborto é realizado também em casos de violência sexual,o qual a mulher sem nenhuma opção adere a prática abortiva.Ainda assim,com o intuito de amenizar a mortalidade infantil,o governo criou em 2010 o bolsa estupro, que oferece auxilio financeiro as vítimas.Mas o projeto desconsidera que o abuso sexual não é só uma questão física como também psicológica,que pode interferir no relacionamento afetivo da mãe para com o bebê.

      Além de abordar a esfera jurídica,o aborto é sobretudo uma questão de sáude púlblica.Conforme pesquisas realizadas pelo Concelho Federal de Medicina o ato abortivo é a quinta causa de morte materna.Entre a classe social alta o abortamento é feito em clínicas particulares oferecendo maior segurança,todavia o mesmo não acontece com mulheres de baixa renda.Elas se submetem as aborteiras que muitas vezes realizam o procedimento em más condições de saúde.

      Portanto,é necessário pensar no aborto como uma questão que vai além do cunho moral,pois trata-se de vida,tanto a que está em formação como aquela que está em pleno desenvolvimento.É importante,também, que haja a qualificação na saúde púlblica para diminuir o número de abortos clandestinos ,espera-se ainda que o Estado repense no direito materno da mulher.
 
Aluna: Nathalia Emmanuella 
   Professor: Diogo Didier                                 


Nunca ouvi tanto essa frase como agora. Só que se todo mundo só fizer o que é de vontade própria, ninguém mais ajuda o outro, considera o outro, trabalha a preocupação de se tirar de cena para fazer algo em prol do sorriso alheio.
Quem só faz o que quer está preparado para receber alguém que possa lhe dedicar os mais nobres sentimentos? A vida não vai nos tratar bem em todas as ocasiões, nem com as princesas da Disney é assim, e note que no lúdico tudo é possível.
Não cuidar das coisas dos outros como se fossem nossas, não ter paciência para fazer tentativas, enaltecer os defeitos, esquecer de fazer elogios (ou pior – achar que isso não é preciso). Que capítulo da responsabilidade com os sentimentos alheios nós perdemos? Como vamos fazer para adquirir destreza com as adversidades da vida?
As pessoas não se amam mais, elas se consomem. Um erro e está decretado o afastamento. Ela usa estampa selvagem. Ele não come japonês. Ele não tem carro. Ela mora com os pais. Ela não gosta de Game of Thrones. Não quero mais. Volto para o Tinder, o catálogo digital das relações sexo-afetivas efêmeras.
Eu preciso do outro para alguns momentos, não para todos.
Não pedimos mais desculpas, não sentimos a necessidade de dar uma satisfação. Dormimos juntos. Acordamos separados. Nunca mais vamos nos encontrar. Postamos no Instagram a frase “mais amor por favor”, mas não exercemos essa condição.
O egoísmo condiciona nossas fraquezas. Os sentimentos negativos existem para nos treinar. Precisamos todos sair do centro do nosso bem-estar. Não tome uma pílula para diminuir a tristeza, experimente colocá-la pra fora. Não engula seu luto, não sofra a conta-gotas. Experimente viver com decência e coragem todas as sensações da falta de alegria. Nada é tão ruim quanto parece. Os desapontamentos têm função decretada em nossas vidas.
São múltiplas as exigências para atender o ego. Como seria se você dedicasse sua vaidade ao exercício da sua inteligência, da sua simpatia? Nosso orgulho não pode durar uma encarnação e meia, mas nossa capacidade de nos tornarmos pessoas melhores pode ser eterna. A barreira narcisista com passagem só de ida é um desrespeito com a felicidade. Com a dos outros e com a sua. Não se iluda!
As pessoas malham, ingerem orgânicos, vestem grifes, aplicam botox, viajam de primeira classe em 10 x no cartão, mas o sedentarismo intelectual é notável. Gritante. Desesperador.
Seu consumo cultural e emocional é você mesmo? Volte dez casas no tabuleiro e vamos começar tudo de novo, precisamos de gente de verdade.

(Denise Molinaro, jornalista)


       A partir do século XIX, com o desenvolvimento do industrialismo houve uma necessidade de controle de massa e deu-se início à cultura midiática. A fome por notícias difundiu uma forma urgente entre os meios de comunicação que de certa forma principiou, sua manobra de contenção e controle da sociedade. Ao mesmo tempo em que a mídia se expandia, a busca por ícones e fórmulas de sucessos publicitários crescia paralelamente. Na procura por solucionar essas questões apostou-se na divulgação e propagação da imagem feminina sendo ela utilizada em quaisquer meio e modo, sem qualquer crivo.  
      Mas para que discutir esse assunto que muitos dizem não ter uma grande importância? Justamente por não ser tratado com a atenção devida é que há uma suma necessidade em debatê-lo. O direito de criticar e avaliar o modo com que a mulher é exposta é válido. Ainda fazemos parte de uma massa sexista, em que uma noção machista está enraizada e tem seus reflexos difundidos em toda a sociedade.  As mulheres já demostraram de inúmeras formas o seu valor quanto cidadãs e quanto trabalhadoras, historicamente sendo exemplos de garra e luta por direitos trabalhistas igualitários. Essas são uma maioria oprimida, que vivem as margens de uma cultura dominada por homens, mas que, paulatinamente, vêm ganhando seu espaço.
       No âmbito do mercado de trabalho, de acordo com o relatório global a respeito do status das mulheres nas mídias de notícias, apenas 46% dos países no continente americano possuem políticas empresariais direcionadas a igualdade de gênero. As estatísticas também apontam para uma ausência de indivíduas encontradas nos quadros de funcionários das corporações, que ainda hoje mantêm uma tradição de uma suposta superioridade masculina. Muitas dessas empresas desconfiam do gênero feminino e seus atributos funcionais e lógicos, dogma este há muito tempo já ultimado e ultrapassado.
       A imagem que a mídia demonstra sobre o gênero é distorcida e distante da real. A partir do momento em que se alastrou o uso de sua imagem, surgiu a tão falada “ditadura da beleza”, onde, de acordo com os meios, as mulheres devem ser jovens, magras, suntuosas, comportadas e saberem o seu devido lugar. Formar uma opinião tornou-se algo difícil para o indivíduo moderno, que absorve e digere as ilusões comerciais que para ele são passadas. Os meios esfregam em nossa face o “jeito certo” de se alcançar o ápice do requinte, mostrando mulheres plastificadas e exuberantes, quando na verdade sabe-se que não há seres perfeitos.
       Os meios de comunicação social são emblemas de poder. Quando se é transmitido um conteúdo desrespeitoso e degradante, ele pode se passar despercebido, graças a uma população alienada, que segue regras e padrões de pensamentos retrógrados.  A sociedade brasileira acostumou-se a ter uma cultura onde há uma supervalorização do corpo feminino; Esse conceito desvaloriza a mulher de uma forma abrupta e revoltante.
  Visar lucros e audiência é o grande objetivo das mídias em geral, que por muitas vezes, se preocupam em encobrir a degradação feminina com piadas e desfechos cômicos. A moral é deixada para escanteio e os meios de comunicação tratam a mulher como objeto descartável, o que pode incentivar outro tipo de violência contra o gênero, a “cultura do estrupo”; que vai além do fato da agressão em si e passa a ser toda a deterioração abusiva da imagem, do psicológico e da pessoa física da vítima.
      Desconfiar do que lhe é imposto torna-se uma resposta aos meios midiáticos, que tanto insistem numa fórmula gasta e vulgar de sucesso fácil. Apostar na forma prática e pronta pode sair caro, já que nem toda a população é alienada, e pode perceber o quão paupérrimas de criatividade são as campanhas. Buscar seu espaço e seus direitos trabalhistas foi um grande passo para mulheres que eram oprimidas e designadas a cumprir o papel imposto para as mesmas, contudo, atualmente o livre-arbítrio já é uma realidade para o gênero. Não se deixar ser enganado e exigir mais respeito, transformou-se um ato de protesto contra os apoiadores da exclusão do gênero na área de trabalho e criadores de infelizes propagandas. Expressar descontentamento com essas imposições é de certo modo uma demonstração de insatisfação e de fuga de mentiras e conceitos maquiados atribuídos atualmente em nossa sociedade. 

Guta Cavalcanti

Eu estava no estádio do Itaquerão, na abertura da Copa do Mundo, e ouvi as vaias e a torcida xingando: “Ei, Dilma, vai tomar no cu”. Não posso afirmar onde as vaias começaram, essa me parece uma certeza muito difícil de garantir num estádio de futebol. Concordo, em parte, com os que alegam que estádios são lugares de palavrões, basta lembrar das mães dos juízes. Mas também discordo, em parte, porque o público da Copa é totalmente diverso do torcedor típico, aquele que vai ver o seu time jogar como uma rotina tão presente na vida quanto trabalhar e namorar. Na Copa, o público é outro, leva para dentro das “arenas” outra expectativa e outra relação com o futebol. Mandar uma pessoa tomar no cu, qualquer pessoa e não só a presidente, é não só grosseiro, como violento. O Brasil é uma sociedade violenta, para muito além da tipificada no Código Penal. Essa violência atravessa o cotidiano. Dito isso, há algo que me incomoda nas narrativas construídas nesse episódio e que valeria a pena prestar mais atenção: a manipulação dos femininos.
 
Logo depois das vaias, surgiu a interpretação de que Dilma só foi xingada nesses termos porque é mulher. É uma hipótese possível, basta lembrar, de novo, que são as mães dos juízes as ofendidas. Basta lembrar das repórteres beijadas ou agarradas enquanto cobrem a Copa, assim como da eleição das gostosas de sempre. O Brasil (e não só o Brasil) é machista e por vezes misógino, há poucas dúvidas sobre isso. Mas não é possível afirmar que Lula, Fernando Henrique Cardoso ou outro presidente não seria xingado se estivesse ocupando o lugar de Dilma na abertura desta Copa. Alega-se que Lula foi vaiado várias vezes na abertura do Pan-Americano, em 2007, mas xingado nenhuma. Existe, porém, o Brasil de antes de junho de 2013 e existe o Brasil depois de junho de 2013. Naquele momento, algo se rompeu e passou a vazar desde então. Assim, afirmar que um presidente homem dificilmente seria xingado, hoje, nesse mesmo contexto e conjuntura, é temerário. Não sabemos. E é preciso ter respeito pelo que não sabemos.
 
Temos a primeira mulher na presidência. E, desde a campanha de 2010, versões do feminino têm sido manipuladas conforme a conveniência. Agora não é diferente. Assim que o xingamento foi consumado, de imediato instalou-se a disputa sobre interpretações que repercutirão nas eleições bem próximas. Para o candidato Eduardo Campos (PSB), num clichê pobre, “na vida a gente colhe o que a gente planta”. O candidato Aécio Neves (PSDB) apressou-se a tirar proveito, afirmando que Dilma estaria “sitiada”: “O que fica para a história é que temos uma Copa do Mundo em que o chefe de Estado não se vê em condições de se apresentar à população”. O PT virou o jogo e conseguiu vencer a disputa narrativa, com a ajuda de parte do movimento feminista. Dilma agora é a vítima da elite mal-educada – e há sempre um lugar de vítima reservado para as mulheres.
 
Mas será que isso é bom para as brasileiras?
 
Acho particularmente irritante o argumento do “não se pode dizer isso a uma mulher” ou “não se trata uma mulher assim”. Se é grosseiro xingar – e é –, é grosseiro com qualquer pessoa, independentemente de sexo e gênero. Culmina com Lula dando uma rosa branca à Dilma. Claro, porque as mulheres devem ser tratadas com rosas. Profundo bocejo. Acho complicado quando Dilma afirma: “Não vou me deixar atemorizar por xingamentos que não podem ser sequer escutados pelas crianças e pelas famílias”. Há uma lista de violências cotidianas sofridas pelas crianças no Brasil, inclusive nos últimos 12 anos, e ouvir alguém mandando outro tomar no cu é desnecessário, mas não é uma delas. A visão de família parafusada nessa frase está mais para “marcha da família” do que para as variações contemporâneas de família que têm enriquecido a vida brasileira. Dilma ainda disse: “O povo brasileiro é civilizado e extremamente generoso e educado”. Se Dilma governasse o país acreditando no que disse, seria preocupante. A elite brasileira é violenta, o povo também é violento. Basta andar nas ruas do país para constatar a “civilidade”. A sociedade brasileira é violenta de cima abaixo, com raízes históricas e omissões contemporâneas bem conhecidas, a começar pela desigualdade de renda e pela péssima educação pública, que condena milhões a uma vida estreita de possibilidades.
 
O risco dessa disputa rasteira, com olhos na eleição logo ali, é que se deixa de pensar seriamente sobre os sentidos do que é o Brasil hoje. E até mesmo sobre os significados das vaias e xingamentos. Tudo é reduzido a slogans publicitários, chapinhando propositalmente em poças d’água. Como a visão do feminino manipulada pela primeira campanha de Dilma. Nela, se lembrarmos, Dilma foi apresentada como “a mãe do PAC”. Ao dizer quais eram as vantagens de uma mulher na presidência, ela enumerou: “Nós, mulheres, nascemos com o sentimento de cuidar, amparar e proteger”. O próprio Lula afirmou que a palavra não era “governar, mas cuidar”. E Dilma acrescentava: “cuidar como uma mãe do povo brasileiro”.
 
Ao aceitar essa estratégia de marketing, que possivelmente representa muito mais a visão de Lula do que a sua, Dilma reduziu os sentidos dos muitos femininos possíveis ao clichê mais tacanho. Sem contar o lugar de “filho” – e não o de cidadão autônomo, com direitos e deveres – reservado ao povo. Dilma foi eleita. Ao governar, irritava-se porque a acusavam de truculência no trato com subordinados e interlocutores. Disse, mais de uma vez, que, se fosse um homem na presidência, ninguém estranharia seu estilo ou cobraria meiguice. Ao mesmo tempo, sempre que alguém tratava a presidente com mais dureza, Lula era o primeiro a protestar pela “falta de gentileza com uma mulher”.
 
Em um governante, assim como num candidato, seja ele homem ou mulher, pouco importa. O que é preciso avaliar é o que faz. E fez. No que diz respeito às mulheres, assim como a questões de sexualidade e de gênero, Dilma recuou. Recuou na questão do aborto, para obter o voto religioso. Recuou ao cancelar a distribuição do kit anti-homofobia nas escolas. Recuou ao tirar do ar uma campanha de prevenção de doenças sexualmente transmissíveis porque uma prostituta dizia que era feliz. Dilma recuou várias outras vezes, recuou demais.
 
Não gosto de xingamentos contra qualquer pessoa. Gosto de rosas. Mas, destas, que confinam as mulheres a uma verdade única e tosca, é melhor manter distância.
 
Eliane Brum é escritora, repórter e documentarista. Autora dos livros de não ficção Coluna Prestes - o Avesso da Lenda, A Vida Que Ninguém vê, O Olho da Rua, A Menina Quebrada, Meus Desacontecimentos e do romance Uma Duas. Email:elianebrum.coluna@gmail.com. Twitter: @brumelianebrum
 


A música toca freneticamente. As luzes reverberam acompanhando esse frenesi produzido pelo ballet de cores luminosas. Em baixo, como marionetes, as pessoas dançam e se entregam ao feitiço das luzes. Estou na balada, mais precisamente na fila para entrar nela. Resolvi sair de casa na esperança de me divertir.  Queria espairecer as deias, ver gente nova e, de preferência, bonita. Ao mesmo tempo, queria ouvir boa música, dançar, comer, jogar conversa fora e, quem sabe, beijar na boca.
Então, foi o que fiz. Fui à balada. Mesmo diante da inquestionável mesmice que me aguardava, decidi, esperançoso, que essa noite seria diferente, coisa que eu já tinha me dito várias vezes nas quatro outras noites do mês passado. Nessa iria me jogar, beber até o sol raiar ou até o meu fígado suportar. Era sábado, no domingo poderia descansar o máximo para recobrar as forças, já que na segunda feira era dia do trampo.
Me arrumei todo, escolhi aquela roupa que melhor valorizava meu corpo. Me banhei de cremes e perfumes, deixando um rastro de diversos aromas juntos no ar. Sem esquecer, é claro, das joias. Pus as minhas pulseiras mais bonitas, alguns anéis impactantes e o relógio mais pomposo de que tanto gosto. Mais uma olhada no espelho. Uma ajeitadinha daqui, uma arrumadinha dali, e pronto. Estava pronto para me jogar. Antes de sair, porém, pensei em ligar para um amigo que me fizesse boa companhia. Pensei em vários e marquei com um. Nos encontramos na entrada da balada, como combinado.
Perto do clube aonde ia, vi outras pessoas arrumadas e prontas para fazer o mesmo que eu, se divertir. Porém, por um instante, eu fui pego pensando no que levaria tanta gente a buscar o mesmo roteiro que eu. Elaborei algumas hipóteses. Talvez estivessem indo comemorar alguma coisa, ou apenas marcaram com alguém interessante. Que sabe para arriscar e encontrar aquela pessoa especial que há tempo faltava em suas vidas. Nesse instante também me perguntei por que eu estava indo à balada e descobri, assustado, que não sabia dizer o que me levava até lá. Talvez um pouco de cada um dos hipotéticos dilemas que criei sobre aquelas pessoas.
Em meio aos meus pensamentos, fixei meu olhar no rosto dos baladeiros ai presentes. Muitos estavam ansiosos por uma possível diversão. Outros exibiam no olhar a necessidade de que aquela noite deveria mudar suas vidas. Muitos desejavam apenas uma noite causal. Poucos queriam encontrar a pessoa ideal. E, por fim, percebi que quase todos ali presentes estavam vazios por dentro e foram badalar em busca de algo que os preenchesse. Inclusive eu. Eu também estava oco, mas não sabia o certo o que me faltava. Semelhante a todos, eu buscava por um nada, que era tudo o que precisava.
Em baixo daquelas luzes, nossas almas ganham vidas e se perdem no emaranhado  de braços ávidos por abraços e bocas sedentas por um beijo de afeto. Com a música ensurdecedora, não escutamos nossos corações baterem. Em seu lugar, ouvimos a batida da música dar vida a um coração tenta renascer dentro de um corpo que já estava morto há muito tempo. Diante disso, continuei fixado nos rostos daqueles desconhecidos e me vendo refletido neles. Mesmo sem saber seus nomes, algo entre nós mantinha um indissolúvel elo. Intuí que a nossa interação era mantida pela terrível sombra da solidão.
Solidão esta que corrói por dentro quando estamos angustiados. Que nos consome quando a frustração bate em nossas portas. É a mesma que quando não concretizamos um desejo, ou quando um sonho morre à deriva no mar da desesperança. O sentimento que nos domina quando alguém especial se vai antes de hora. Ou quando sentimos que o mundo a nossa volta nos abandonou. Movidos por essa solidão, buscamos nos safar dela em bares, boates, clubes, enfeitiçados por uma alegria efêmera vem e vai tão rápido quando uma dose de gim, ou quando a noite insistem em ceder para o dia.
Sem perceber, eu estava só no meio de tantas outras pessoas na mesma situação. Querendo me encontrar, me deparei com outros indivíduos perdidos e drinks alucinantes e danças cada vez mais provocantes. Semelhante a tantos outros nessa centelha de falsos prazeres, fiquei imóvel vendo a multidão entrar. Senti a presença do meu amigo chegar, mas não reagi. Não estava lá. De repente, como se tivesse acordado de um transe, olhei em todas as direções e vi que na babada é tudo igual. Jogos de luzes, música contagiante, alegria de outdoor e nada mais. Festa de vampiros que se desfazem ao amanhece entre cinzas, silêncio e solidão, como no triste olhar do pierrô.
Com o estridente toque do meu celular, voltei à consciência do transe que estava. Me vi pronto para sair de casa em frente ao espelho com o olhar distante, vago. Entre sonho e realidade, fiquei na dúvida entre sair e vivenciar o que acabara de imaginar, ou em ficar e casa. Sabia que era uma daquelas pessoas solitárias em busca de um autoencontro. O desejo de desistir da noitada aumentava. Não podia fazer o que todos fazem, muito menos consciente disso. Deveria haver um jeito de preencher esse vazio que me consome. Mas, quando o meu telefone tocou mais uma vez, vi que era o número do meu amigo. Atendi pronto para recusar qualquer convite. Ele, mais rápido que eu, foi direto ao ponto. Seu pedido foi claro: vamos babalar? Te espero lá! Falei sem hesitar.


       Não é de hoje que a religião e a ciência se divergem em vários assuntos. Um deles, que causa bastante polêmica, é a legalização do aborto. Nos dias atuais, contamos ainda com os movimentos feministas que lutam e apoiam esse fato.
        No lado científico, o feto com até 4 semanas não possui vida ainda, pois o seu cérebro não foi formado e por isso o aborto não deveria ser considerado crime. Porém, o lado religioso, considera crime em qualquer estágio da gestação, pois eles acreditam que desde a fecundação, já há uma vida. Talvez, o Brasil, como um país laico, não deveria olhar tanto para o lado religioso.
        Alguns países como os Estados Unidos, já legalizaram o aborto. Contudo, o Brasil ainda considera esse ato um crime, exceto para 3 situações: risco de vida para a gestante, bebês anencéfalos e em casos de estupros. Cada vez mais cresce o número de abortos, principalmente os clandestinos. De acordo com o ministério da saúde, são aproximadamente 200 mil abortos clandestinos por ano. Esse ato ilegal, trás inúmeros riscos de vida para a gestante.
        Outro fator importante, é que infelizmente vivemos em um país machista, onde só as mulheres são culpadas, ou até inferiorizadas, por praticarem o ato abortivo. A partir dessa ideia, que os movimentos feministas foram ganhando força.
        Sendo assim, deve haver um investimento público em educação sexual, para que assim aconteça uma conscientização da população e eles comecem a fazer um planejamento familiar. E que a mulher tenha seu próprio direito de escolha, sem que a mesma seja julgada.

Aluna: Ingrid Lacerda Santos
Professor: Diogo Didier

Este texto é um resumo de outro publicado em 2011 com uma conotação pretensamente científica. Aqui, tento uma abordagem mais livre.
 
Não é possível que todas as pessoas sejam “iguais”, como muitos querem, e não possamos tratar de diferenças.
 
Tento mapear diferenças entre a mulher considerada segura e a insegura. Tomo por “segurança” uma estrutura pessoal ligada essencialmente à inteligência, à leveza e naturalidade das ações e reações rápidas e encantadoras, à sagacidade, à firmeza das decisões.
 
Delimito o assunto na mulher urbana do grande centro, trabalhadora ou executiva. Acho que o tema é importante para a mulher, sabendo-se que aqui há apenas uma interpretação, a minha, nada mais que isso.
 
Sabemos que conceitos como “segurança” e “insegurança” são bastante imprecisos e exigem definições prévias. Mas também podemos aceitar, apenas para compreensão, o que de comum costumamos perceber e considerar em alguém como seguro ou inseguro.
 
Falar da mulher segura ou insegura talvez seja mais apropriado do que falar do homem. Em razão do machismo, o homem foi constantemente habituado a ser mais “cobrado” do que a mulher. Ter que produzir, sustentar a família, ser o mantenedor. Não que isso, por si só, dê qualquer privilégio ao homem, até porque, atualmente, também se reverteu em grande parte. Mas por esse costume a mulher pôde ou foi forçada a ficar mais na retaguarda; mais a reboque do homem.
 
Uma primeira observação que cabe é acerca do patrulhamento sobre “comparações”. Estudiosos reclamam das comparações, no sentido de que não se pode fazer análises com lados opostos ou maniqueísmos. Mesmo assim, guardadas as proporções e ressalvas, tento nas colunas abaixo, um menu que me parece razoável, ainda que “bem humorado” ou “adulto” em certas suposições. No lado esquerdo estão “indicativos” da mulher segura. No lado direito, sem um antagonismo direto, diametral ou formalista, porém mais filosófico, estão o da mulher insegura. Vale à pena refletir sobre cada uma das “comparações” (comparações entre aspas!), sabendo-se que as posições, muitas vezes, acabam se misturando. Ninguém é totalmente seguro e ninguém é totalmente inseguro. Assim, teríamos:
 
MULHER   SEGURA
MULHER   INSEGURA
Comissiva
Não quer incomodar
Age
Circula o fazer
Questiona
Prefere concordar por alguma   subserviência
De gozo audível
Contorce-se com pudor
“Engole”
Nem cogita
Abocanha
Precisa combinar
Vira e se revira
Espera o parceiro
Qualquer lugar serve
“Aqui não fica bem”
Gargalha
Cerimoniosa
Social
Espera autorização
Pergunta
Espera para responder
Rápida
Receosa
Ilimitada
Possui um menu portátil de pudores
Descolada
Conservadora, chata
Pode estar sem esmalte
“a aparência é tudo”
Dirige silenciosamente
Usa a buzina para reclamar a cada   esquina
Pode beber de bambear
Bambeia sem beber
Pode declarar ciúme infernal
Prefere chorar ou desistir
Fala palavrão
Não comete essa falta de   “educação”
Fica puta
Fica nervosa
Decide
Espera
Não tolera manha do filho
Consulta psicólogo para saber como   educar
Negocia
Cumpre
Enfrenta
Evita certos assuntos
“Se acha” e sabe escolher   roupa
Pergunta para as amigas
Aconselha
Vive em dúvidas
Identifica e adora genialidades
Para ela todo mundo é igual
Ousa
Segue
Inventa
Copia
Fecha questão
Adia
Não tem tabus
Tem coisas que “prefere não   comentar”
Aguenta ouvir
É escapista
 
Não vive dizendo: eu sou segura
vive repetindo: “quando eu quero, sei   ser segura”
 
Ainda, a mulher segura exige muitos itens do lado esquerdo para se dizer ser uma pessoa segura. Já a insegura identifica 1 ou 2 itens do mesmo lado esquerdo para dizer: “tá vendo? eu também sou segura”. A segura é; a insegura precisa dizer que é. A segura vive sua segurança normalmente; a insegura anuncia uma segurança que muitos percebem que não existe.
 
A mulher segura é um espetáculo, uma delícia, apaixonante, divertida, alegre, risonha, gargalhativa, sacana, sinérgica, ágil, ou preguiçosa. E comilona. Vive rodeada de pessoas que fazem questão de sua companhia, é uma líder nata, disputada por todos. Esta mulher eventualmente pode criar caso e brigar, invariavelmente com explosões sonoras encantadoras a um observador atento (e apaixonado).
No plano da traição a mulher segura parece ser mais confiável que a insegura. A mulher segura não precisa “provar” nada. Não trai porque se vê bem resolvida com o parceiro. E mesmo traída talvez absorva a tragédia sem se violar, sem se violentar, sem uma vingança de plantão para “provar” que também pode ou sabe trair. Ou talvez largue o homem falando sozinho no meio da rua. As reações são próprias da segurança, seja para que lado for. Talvez por ser menos formalista, e mais de conteúdo, a mulher segura quando sofre vive um drama sério, com dores lancinantes. Suas análises são menos superficiais ou estéticas, e mais ligadas às profundidades do sentir.
 
Quanto à beleza (aparência, estética) a mulher segura se torna linda, encantadora de qualquer jeito e modo. Seu discurso é vivo, sua fala é suntuosa e sua conversa é hipnótica. Tem seguidores e há o encanto genuíno e não forçado nela.
 
Um questionamento interessante é se saber se a mulher insegura pode “se tornar” segura. Queremos que sim, torcemos para isso. Mas sabemos que em alguns casos isso pode ser um traço meio invencível de personalidade.
 
O caminho talvez seja longo, mas parece valer à pena. Começa com uma leitura verdadeira, objetiva e racional de a própria mulher se conhecer. A fundo e sem medos. Pedir a amigos queridos, por exemplo, que digam, confessem, assumam um “diagnóstico” ou uma interpretação para ela, sobre os próprios pontos em que poderia ser insegura. Mas deve querer “ir” às profundezas das fraquezas, mapeando-as, sem medo de manuseá-las ou expô-las.
 
Acho que é muito fácil e simplista querer se “atacar” a possibilidade de mudança pessoal, dizendo que isto ou aquilo é um absurdo, uma violência, uma imbecilidade. Mudanças não são projetos simples, mas acredito que possam ser possíveis. Isso tudo aqui, a própria comparação sugerida por mim, parece beirar a um racionalismo oitocentista, meio cartesiano, reconheço, em que o emocional não é considerado. Mesmo com todas essas observações e ressalva, não somos bichos e nossa racionalidade pode nos ajudar muito.
 
Cada um acredita no que quer e gosta e isso é livre e soberano. Pessoas, homens ou mulheres, há que são seguros e outros inseguros. Buscar uma melhora é sempre algo louvável. O clichê de que “ninguém muda ninguém”, ou ninguém faz a cabeça de ninguém “também” é verdade, mas não é verdade total. Como se fôssemos dotados de um fixismo personalista ou uma teleologia genética no sentido de que fomos feitos assim e não mudaremos.
 
A mulher é em si o melhor dos mundos. O melhor prazer, a melhor companhia, o melhor amor. E com aquele cheiro; (o que é aquilo?). Se além disso tudo, ainda for uma poderosa segura, para toda uma noitada de conversa, uísque, charuto e gargalhadas infinitas, aí ninguém aguenta. Deixo aqui um beijo para todas as meninas, com a doçura do coração e a crença de que todos podemos evoluir durante a vida.
 
Jean Menezes de Aguiar
 


      Tratado de forma banal, a homofobia é um problema antigo que anda crescendo recentemente. Denominada de uma espécie de medo irracional, tendo como ponto centra a atitude de colocar outra pessoa na condição de inferioridade, ocasionando uma forma de preconceito que se estende de forma agressiva através de violência física ou verbal.

      De acordo com o relatório feito pelo Grupo Gay da Bahia, um gay é morto a cada 28 horas no país. Em 2013, foram registrados 312 assassinatos de gays, travestis, lésbicas no Brasil. A vida de um ser geralmente é medida por sua orientação sexual ou gênero, tendo em vista que pessoas leigas julgam, discriminam e praticam a violência contra homossexuais.

      Ainda não há no Brasil uma lei específica que combata e reprima a homofobia. Consequentemente, a ausência de leis que punam atos violentos contra LGBTS tem ajudado para que o número de homicídios aumente. Não tendo punição, o desrespeito impera ocasionando tristes fatalidades.

      Não aceitar nem respeitar o direito das pessoas de auto determinarem o uso do seu corpo, seu comportamento sexual, desejos e orientações, tem feito com que a homofobia se torne um preconceito infelizmente comum sem opressão. Tais fatos podem ocasionar danos físicos e psicológicos permanentes ao indivíduo que sofre deste tipo de agressão. 

      Para cessar essa tamanha opressão que amedronta milhares de gays, seria necessária uma mudança de comportamento e reeducação universal, para que se consiga a aceitação ao próximo dando o direito de opinar sobre sua condição sexual. É necessário que as pessoas passem a enxergar com mais racionalidade e aceitem que todos têm os mesmos direitos de ser livres e se expressar da forma, a qual achar melhor.

Aluna: Renata Alves
Professor: Diogo Didier

 
*Paulo Mendes Campos
O amor acaba. Numa esquina, por exemplo, num domingo de lua nova, depois de teatro e silêncio; acaba em cafés engordurados, diferentes dos parques de ouro onde começou a pulsar; de repente, ao meio do cigarro que ele atira de raiva contra um automóvel ou que ela esmaga no cinzeiro repleto, polvilhando de cinzas o escarlate das unhas; na acidez da aurora tropical, depois duma noite votada à alegria póstuma, que não veio; e acaba o amor no desenlace das mãos no cinema, como tentáculos saciados, e elas se movimentam no escuro como dois polvos de solidão; como se as mãos soubessem antes que o amor tinha acabado; na insônia dos braços luminosos do relógio; e acaba o amor nas sorveterias diante do colorido iceberg, entre frisos de alumínio e espelhos monótonos; e no olhar do cavaleiro errante que passou pela pensão; às vezes acaba o amor nos braços torturados de Jesus, filho crucificado de todas as mulheres; mecanicamente, no elevador, como se lhe faltasse energia; no andar diferente da irmã dentro de casa o amor pode acabar; na epifania da pretensão ridícula dos bigodes; nas ligas, nas cintas, nos brincos e nas silabadas femininas; quando a alma se habitua às províncias empoeiradas da Ásia, onde o amor pode ser outra coisa, o amor pode acabar; na compulsão da simplicidade simplesmente; no sábado, depois de três goles mornos de gim à beira da piscina; no filho tantas vezes semeado, às vezes vingado por alguns dias, mas que não floresceu, abrindo parágrafos de ódio inexplicável entre o pólen e o gineceu de duas flores; em apartamentos refrigerados, atapetados, aturdidos de delicadezas, onde há mais encanto que desejo; e o amor acaba na poeira que vertem os crepúsculos, caindo imperceptível no beijo de ir e vir; em salas esmaltadas com sangue, suor e desespero; nos roteiros do tédio para o tédio, na barca, no trem, no ônibus, ida e volta de nada para nada; em cavernas de sala e quarto conjugados o amor se eriça e acaba; no inferno o amor não começa; na usura o amor se dissolve; em Brasília o amor pode virar pó; no Rio, frivolidade; em Belo Horizonte, remorso; em São Paulo, dinheiro; uma carta que chegou depois, o amor acaba; uma carta que chegou antes, e o amor acaba; na descontrolada fantasia da libido; às vezes acaba na mesma música que começou, com o mesmo drinque, diante dos mesmos cisnes; e muitas vezes acaba em ouro e diamante, dispersado entre astros; e acaba nas encruzilhadas de Paris, Londres, Nova Iorque; no coração que se dilata e quebra, e o médico sentencia imprestável para o amor; e acaba no longo périplo, tocando em todos os portos, até se desfazer em mares gelados; e acaba depois que se viu a bruma que veste o mundo; na janela que se abre, na janela que se fecha; às vezes não acaba e é simplesmente esquecido como um espelho de bolsa, que continua reverberando sem razão até que alguém, humilde, o carregue consigo; às vezes o amor acaba como se fora melhor nunca ter existido; mas pode acabar com doçura e esperança; uma palavra, muda ou articulada, e acaba o amor; na verdade; o álcool; de manhã, de tarde, de noite; na floração excessiva da primavera; no abuso do verão; na dissonância do outono; no conforto do inverno; em todos os lugares o amor acaba; a qualquer hora o amor acaba; por qualquer motivo o amor acaba; para recomeçar em todos os lugares e a qualquer minuto o amor acaba.


Baterias cheias, pessoas vazias

 

      Com a invenção dos primeiros computadores nos anos 30, uma nova era surgia. O aumento da tecnologia e melhorias em suas funções, a sociedade se tornou cada vez mais dependente das máquinas. Hoje, além de muito úteis no dia a dia por serem práticas e rápidas, são utilizadas por uma grande parte da população como passatempo. Porém, é importante lembrar que antes dos teclados, as letras já existiam e a escrita é a base da formação humana.
      Segundo uma pesquisa feita pela FGV (Fundação Getúlio Vargas), em média a cada 5 habitantes do Brasil, 3 possuem computador. O problema é que as pessoas estão ficando dependentes demais de telas digitais e esquecendo-se da vida real fora do virtual. No Japão já existe uma clínica de reabilitação para jovens que não conseguem viver sem a comunicação através de aparelhos celulares ou computadores, desconforto que recebe o nome de nomofobia.

      Escrever é muito importante, de fato, mas com todo o conforto de digitar, a  população vem deixando o papel para segundo plano. Os trabalhos de escola com cartazes foram trocados por slides, cartas foram trocadas por emails e visitas foram trocadas por mensagens em redes sociais. Assim, comentários sobre preguiça de escrever ficaram muito comum e a escrita se tornou algo não prazeroso de se fazer.

       O que a sociedade precisa perceber é que com a falta de prática da escrita, muitos problemas são ocasionados, como déficit de um vocabulário formal, má qualificação para bons empregos e uma mente menos criativa. Algumas escolas no Brasil substituem livros impressos por tablets, a inclusão dessa tecnologia é útil para a performance dos  alunos com a tecnologia, mas os livros são de extrema importância para a sensibilidade dos alunos.

      Portanto, não é preciso radicalizar e abolir as inovações digitais, mas balancear o contato com elas. Favorecer a escrita e não se prender ao virtual são atos essenciais para lidar com o mundo profissional e essencialmente importante para o social. Até hoje não há tecnologia capaz de substituir um abraço verdadeiro.

 

Aluna: Marahma
Professor: Diogo Didier

Toda pessoa preconceituosa é moralista. A relação é de promiscuidade mental. O preconceituoso reprova e exclui o outro apenas pelo que este outro é

Muitos se julgam espertos suficientemente para manter preconceitos e achar que ninguém percebe. Alguns têm consciência de suas cismas mentais. Outros chegam a sentir orgulho. Mas isto desafia reflexões.
 
Toda pessoa preconceituosa é um moralista. A relação é de promiscuidade mental. O preconceituoso reprova, inadmite e exclui o outro apenas pelo que este outro é. Nietzsche já desmontava esse farisaísmo social. ‘Nada é mais raro entre moralistas e santos do que a retidão’, ensinava o filósofo na obra Crepúsculo dos ídolos, número 42.
 
O preconceito não é algo que se ‘quer’ apenas de uma forma estigmatizada ou feia. Também não é uma ‘escolha’ que a parcela ‘cult’ ou ‘entrei-numa’ da sociedade fez no sentido de começar a achar ruim certo comportamento. Aliás, esses ‘yuppies’ da sociedade, os ‘metro-mentais’ com seus ternos pretinhos de calça fusô não produzem nada muito admirável.
 
O preconceito pode ter duas causas: atraso ou provincianismo. Mas uma coisa é certa, é uma manifestação de ignorância. No sentido ruim. Está na contramão do progresso social como um todo, da natural evolução dos povos e dos novos direitos. Historicamente sempre foi assim.
 
Quem acha bonito cultivar preconceitos deve refletir que passa para o mundo a imagem do ‘fariseu’ de Nietzsche. Ou a imagem do famoso ‘imbecil’ de Bertold Brecht, no poema ‘O analfabeto político’.
O capiau ou matuto da roça tem seus preconceitos pacatos. Talvez mais defensivamente, por ‘medo’ da cidade grande e sua gente. Mas certamente o preconceito mais danoso seja o do ‘doutor’ referido por Marilena Chaui na obra Cultura e democracia, p. 355. Ou de sua esposa, a lourinha com cabelo autoritariamente liso e mente ultrarreacionária sugerida por Chaui no espetacular vídeo-aula sobre a ‘classe média’, no Youtube.
 
Certa elite capitalista, deslumbrada com o poder financeiro, desperta para a ideia do ‘pensar’. Como se esta tarefa humana fosse simples e fácil. Aí talvez esteja uma das raízes do preconceito como se conhece nas sociedades urbanas e tecnológicas. Valores, juízos, educações, relações e visões de mundo são ‘teorizados’ por qualquer um desses aí. De um esquizofrênico cabo nazista chamado Hitler e sua horda de energúmenos, até um nouveau riche do petróleo ou da soja qualquer. ‘Mesmo’ que bilionário.
 
Racismo, sexismo, machismo, discriminações ou ódios étnicos, rácicos e religiosos, tão comuns na sociedade brasileira, ainda que alguns bem disfarçados, são exemplos de preconceitos danosos. Também o tal do ‘bom gosto’ tão bem referido por Adriana Calcanhoto na música ‘Senhas’, é uma forma perigosa de intolerância disfarçada de ‘chique’.
 
O fato é que o preconceito ficou bastante estigmatizado. Ninguém vai querer assumir uma posição discriminatória. Todo mundo jurará não ser preconceituoso, apenas ter um ‘modo próprio’ de ver a questão. Daí, uns invocarão liberdade de expressão; liberdade de pensamento; liberdade de crença filosófica ou religiosa; e mesmo a não-discriminação para exercer seu ‘modo de pensar’. Ou seja, querem que o preconceito seja um direito.
 
Como não há um menu universal de o que é ser preconceituoso, ficam noções gerais e principiológicas. Na educação, nas sociedades e nos sistemas jurídicos. A Constituição da República, por exemplo, no artigo 5o, inciso XLI, é taxativa: ‘A lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais.’
 
Nos 78 incisos que compõem o citado artigo constitucional, que garantem a plena liberdade da pessoa, está um indicativo seguro de que nada que ‘discrimine’ relativamente àquele rol será aceito. Ou seja, reduza, diminua, impeça a pessoa de ser o que ela queira ser, livremente. Desde que este ‘livremente’ não seja ser livremente preconceituoso.
 
A defesa do preconceito costuma invocar uma ou outra ‘lógica’. O problema é que como a lógica não se interessa com a verdade ou falsidade das premissas, mas apenas com sua relação, dá-se uma aparência de perfeição. Mas no caso do preconceito, saber se o conteúdo é bom ou podre faz toda a diferença.
 
Políticos brasileiros ultraconservadores, reacionários ou fundamentalistas, por exemplo, têm se insurgido contra a união gay. Este é apenas um exemplo. Alegam, os políticos, que não podem ser ‘discriminados’. Querem exercer a intolerância com liberdade. O problema é saber se, por exemplo, alguém tem direito a ser nazista, alegando que não pode ser discriminado. O ‘conteúdo’ nazista ofende a história e o mundo. Houve uma coesão mundial em torno do tema. Assim é com outros tantos temas.
 
O direito comparado, a história, a sociologia dos sistemas evoluídos, o cinema e as artes são um ótimo referencial para se identificar o rumo que determinadas questões vêm tendo no mundo. Se uma determinada questão vem sendo paulatinamente aceita ou proibida.
 
Qualquer pessoa que queira ‘calibrar’ o próprio pensamento, sua visão de mundo e suas ideias, se tomar por base um menu de referências assim terá uma ótima ferramenta. Poderá melhorar muito os próprios conceitos.
 
Mas uma coisa é certa. Quando se começa a ouvir, maciçamente, que determinada questão é preconceituosa, pode-se estar diante de um poderoso indicativo. Não é o meu umbigo que diz o que é ou não é preconceito. Nem o seu. É o mundo. E ele precisa de mais tolerância, afeto e amor. Não apenas nominalmente, como bandeira política. Mas de verdade.
 
Jean Menezes de Aguiar, Observatório Geral